terça-feira, 20 de fevereiro de 2018

Quarteirão do polémico “mono do Rato” vai mesmo ser demolido nos próximos dias / Uma questão de promiscuidades 19.07.2009, António Sérgio Rosa de Carvalho / Associação cívica desencadeia acção popular em tribunal contra o “mono do Rato” Ana Henriques 14/04/2011



“[O projecto] regressava à ordem de trabalhos de uma reunião do executivo camarário perto do Natal de 2010. Depois de muita discussão, o “mono do Rato”  – que sempre contou com o público apoio da Ordem dos Arquitectos, para quem a negativa no licenciamento careceria de fundamento legal – acabaria por ser aprovado, a 22 de dezembro, com os votos favoráveis do PS, a abstenção do PSD e do CDS, enquanto Helena Roseta (independente) e Rúben de Carvalho (PCP) preferiram sair da sala, por se recusarem votar sob ameaça de procedimento judicial do promotor. [ que exigia 1,6 milhões de euros a cada um. ]” in OCORVO
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BASTA ! Artigo de Opinião, publicado a 30 de Dezembro de 2010 quando do primeiro projecto para o Largo do Rato.
LOCAL LISBOA
Basta!
ANTÓNIO SÉRGIO ROSA DE CARVALHO 30 de Dezembro de 2010, 0:00

Enquanto a destruição sistemática e organizada do que resta das Avenidas continua em perfeita sintonia com uma classe de arquitectos, indiferente ao seu Património insubstituível, e determinada a assumir o estatuto de arquitectos do regime, Manuel Salgado, mais transformado em "porteiro" dos interesses estabelecidos, em lugar de defensor e garantia de salvaguarda dos interesses da cidade, assina um acordo inaceitável a priori com um promotor, tornando-se assim cúmplice de chantagem vergonhosa sobre os eleitos.

O resultado ultrapassou todas as marcas do eticamente escandaloso e do ilegal, tornando este caso de licenciamento definitivo do Projecto do Largo do Rato num símbolo manipulativo de abuso de poder.

Resta agora à sociedade civil transformá-lo num símbolo definitivo de resistência "musculada" e tenaz, que fique para a História como um sinal de maturidade da democracia participativa contra a tirania das manobras maquiavélicas e manipulativas de uma certa forma de exercer a democracia representativa.

Que se aproveite também para meditar sobre o papel afirmativo (em ruptura irreversível) e destruidor de muitos arquitectos com relação ao património, atitude bem ilustrada nas Avenidas e simbolizada no projecto da sua Ordem, nos antigos Banhos de S. Paulo.

Desta história, no Largo do Rato, ninguém sai incólume. Como é possível ouvir alguns representantes da vontade popular afirmar que esta decisão "foi a forma mais simples de fazer com que a cidade possa funcionar", e que o papel dos eleitos "não é achar [o projecto] bom ou mau, é verificar se está em conformidade com a lei" (vereadora Livia Tirone ), mas afirmando também que o projecto "é completamente dissonante" e lamentando que ele tenha sido aprovado "sem debate público"?

Este paradoxo ilustrativo do absurdo, ou de algo bem pior, não pode ser comparado ao protesto indignado de Ruben de Carvalho ou Helena Roseta sobre as pressões inaceitáveis de um processo jurídico desenvolvido com a cumplicidade do vereador do Urbanismo, no momento em que este assina um compromisso de acordo que antecede e influencia a decisão.

De resto, todos os vereadores do Urbanismo anteriores são responsáveis e tomaram decisões que permitiram ou determinaram este processo de destruição sistemática da Lisboa Romântica. Um dos argumentos continuamente esgrimidos, e agora reutilizado, numa manobra surpreendente de aproveitamento da "terra de ninguém" criada por várias "ausências" forçadas ou voluntárias, foi o da sua anterior aprovação em 2005.

Toda esta situação leva-nos à pergunta fundamental: Qual é a formação técnica e académica deste eleitos? Qual é a garantia oferecida pelas suas pessoas para decidir sobre o futuro da cidade de Lisboa?

Resta agora aos cidadãos uma luta definitiva e decisiva, capaz de contribuir para o seu processo de autoconsciência e afirmação da sua maturidade democrática e de fazer sentir aos políticos o que sentimos perante este caso vergonhoso. Basta!

Historiador de arquitectura

Quarteirão do polémico “mono do Rato” vai mesmo ser demolido nos próximos dias

Samuel Alemão
Texto & Fotografia
13 Fevereiro, 2018

O espanto e a curiosidade, acompanhados de alguma preocupação pela falta de informação visível, foram crescendo entre passantes e vizinhos, ao longo da véspera de carnaval (segunda-feira, 12 de fevereiro), e ao mesmo tempo que se procedia à colocação de tapumes. O quarteirão confinado pelo Largo do Rato e pelas as ruas do Salitre e Alexandre Herculano e que, entre 2004 e 2011, esteve no centro de uma polémica devido ao plano para a construção de um grande edifício de traço contemporâneo, assinado pelo arquitectos Manuel Aires Mateus e Frederico Valsassina, será demolido nos próximos dias. Mais de sete anos após a aprovação, em dezembro de 2010, daquele que ficou conhecido como o “mono do Rato”, prepara-se agora para acontecer uma mudança radical naquele gaveto urbano, que culminará com uma nova edificação. O Corvo tentou saber se é o mesmo projecto ou outro, mas tal não foi possível apurar até ao momento da publicação deste artigo.

 “Isto é tudo para ir abaixo, mal a gente acabe de instalar os tapumes”, confirmou a O Corvo um dos dois operários que, na tarde desta segunda-feira, trabalhavam no local e, com regularidade, eram interpelados pela curiosidade de quem se deparava com tal cenário. “É com grande pena que vejo que este quarteirão vai ser destruído. Depois da imensa polémica que aquele projecto causou e da mobilização das pessoas contra a sua construção, fica-se um pouco triste por ver que, afinal, estes edifícios vão ser demolidos. Perde-se um pouco da identidade desta zona”, desabafava uma mulher, moradora na Rua do Salitre, após ter interrogado a parelha de trabalhadores. Além dos tapumes, não era visível qualquer informação sobre o que irá ali acontecer, nem sequer a obrigatória publicidade ao licenciamento camarário. O dono do restaurante Ratoeira Minhota, uns poucos metros mais à frente na mesma rua, também diz desconhecer o que surgirá ali. “Depois daquela polémica, acho que vão fazer uma outra coisa”, assevera.

“Aquela polémica” esteve particularmente activa durante seis anos, desde 2004, quando foram dadas a conhecer as imagens do projecto de Aires Mateus e Valsassina para aquele recanto do Largo do Rato, e até ao início de 2011, pouco depois de o mesmo ter sido aprovados em reunião camarária, já com alterações introduzidas. De permeio, um enorme debate, pontuado por posições extremadas, contra e a favor, sobre a adequação de uma tão radical proposta para aquela zona. O edifício de habitação e escritórios acabou por se revelar bem mais polémico e repleto de arestas do que a sua fachada de tom minimalista, feita em pedra e vidro, a rasgar o classicismo daquela zona. Depois de, em 2005, durante a presidência de Pedro Santana Lopes (PSD), o projecto de arquitectura do edifício ter sido aprovado pela então vereadora do urbanismo, Eduarda Napoleão, com recurso a uma prerrogativa especial, o licenciamento da obra acabou, porém, por ser chumbado por duas vezes em 2008, já com António Costa (PS) à frente do município.

Mas os votos contra não vieram dos então seis vereadores eleitos pelo PS, partido que tem no Largo do Rato a sua sede nacional. Deles chegaram, aliás, na altura, os únicos votos favoráveis ao projecto, cujo impacto paisagístico e ainda a necessidade de fazer um plano de pormenor para a zona motivaram a união na sua rejeição dos outros onze membros da vereação – algo que aconteceu por duas vezes, em julho e em novembro de 2008. Há uma década, PSD, PCP, Bloco de Esquerda (que elegera José Sá Fernandes), mas também a vereadora Helena Roseta – eleita pelo Movimento Cidadãos por Lisboa numa coligação que garantira a vitória de Costa nas eleições intercalares de 2007 – juntaram-se para vetar uma construção muito criticada não apenas pela sua grande escala, mas também pela sua implantação e relacionamento com a envolvente. A então vereadora do PSD Margarida Saavedra chegou a propor a construção de um jardim naquele local. O chumbo do arrojado empreendimento imobiliário levou a que o seu promotor decidisse, no início do ano seguinte, em 2009, processar judicialmente os onze membros da vereação que votaram contra, pedindo 1,6 milhões de euros a cada um.

No final daquele mesmo ano, o processo teria novos desenvolvimentos, com o mesmo promotor a admitir publicamente que estaria disposto a fazer algumas alterações ao projecto original, desde que a integridade do mesmo não fosse afectada e os interesses económicos da empresa prejudicados. Um responsável do grupo económico, a Arte Pura – Investimentos Imobiliários SA, adiantava ao jornal PÚBLICO que, naquela altura, estariam a ser desenvolvidos “exercícios teóricos” pela dupla de arquitectos no sentido de ver o projecto aprovado – em paralelo, decorreriam contactos “informais” com os serviços de urbanismo da Câmara Municipal de Lisboa. O certo é que, poucos meses depois, em março de 2010, António Costa também se mostraria publicamente disponível para dialogar com a promotora sobre este dossiê. Algo que aconteceria no momento em que a vereação – com os votos favoráveis do PS e a abstenção do PSD, PCP e CDS – aprovaria a revogação do anterior chumbo do licenciamento, após ter admitido “vício de forma” do mesmo acto.

Algo que estaria relacionado com o facto de, aquando do último chumbo, ocorrido em novembro de 2008, ao promotor não lhe ter sido dada oportunidade de se pronunciar sobre os fundamentos do mesmo – direito previsto no Código de Procedimento Administrativo. Assumido e corrigido o erro, estava então aberta, de novo, a porta para a insistência na construção de tão contestada obra. Feitas as necessárias alterações ao projecto – com os arquitectos a mexerem nas fachadas, mas também a eliminarem as caves e o comércio no rés-do-chão -, ele regressava à ordem de trabalhos de uma reunião do executivo camarário perto do Natal de 2010. Depois de muita discussão, o “mono do Rato”  – que sempre contou com o público apoio da Ordem dos Arquitectos, para quem a negativa no licenciamento careceria de fundamento legal – acabaria por ser aprovado, a 22 de dezembro, com os votos favoráveis do PS, a abstenção do PSD e do CDS, enquanto Helena Roseta (independente) e Rúben de Carvalho (PCP) preferiram sair da sala, por se recusarem votar sob ameaça de procedimento judicial do promotor.


O Corvo tentou obter, ao longo da tarde desta segunda-feira (12 de fevereiro), junto da Câmara de Lisboa, esclarecimentos sobre o projecto que ali nascerá. Mas tal não foi possível, no entanto, até ao momento da publicação deste artigo.




Uma questão de promiscuidades

19.07.2009, António Sérgio Rosa de Carvalho in Público.
(...) –“ não quero mais encomendas a arquitectos do star system, a cobrarem fortunas por "maquetas" feitas de caixas de sapatos;”
- “não quero mais destruição do património arquitectónico, através da especulação imobiliária ou da "criatividade" corporativa dos arquitectos, não só nas avenidas românticas, mas em toda a Lisboa. Isto implica Largo do Rato, Terreiro do Paço, etc, etc.”

Uma questão de promiscuidades
19.07.2009, António Sérgio Rosa de Carvalho

"A cidadania não vai a votos. A cidadania exerce-se"! Num texto anterior publicado no PÚBLICO, afirmava isto, motivado pela necessidade de defender "um cordão sanitário" entre a jovem e frágil democracia participativa e a erodida e desprestigiada democracia representativa.
Algo mais, já então, me motivava. A consciência intuitiva de que Helena Roseta pertencia àquele grupo de políticos profissionais que, conscientes do cansaço, erosão e de um progressivo distanciamento dos votantes, encontrava nos "cidadãos" participativos uma fórmula "refrescante" e uma oportunidade de "reformatar" o discurso. A máscara caiu. A razão diz-nos que não é supreendente, mas o sentimento exalta uma indignação, perante um sentimento de manipulação, ou mesmo, e é preciso dizê-lo, de traição.
A enorme bofetada que Helena Roseta dá em todos aqueles que seguiram o seu discurso de independência implica também uma enorme machadada na jovem e frágil democracia participativa, e, consequentemente, directa e indirectamente, na credibilidade da já tão doente democracia representativa.
Ela, de forma brutal, projecta todos aqueles que acreditaram numa plataforma de participação transversal aos ciclos políticos, num espaço ecléctico e pluralista de manifestação de individuos-cidadãos, unidos apenas pela urgência dos temas, novamente, na polarização dos blocos políticos e dos aparelhos ideológicos.
Ela mata, assim, uma dialéctica estimulante e melhoradora da própria democracia ao, de forma facciosa e oportunista, querer monopolizar a cidadania para um campo da "esquerda", como se tal fosse possivel...
Esta atitude é comparável à afirmação de que o humanismo do séc. XXI, a consciência ambiental, a ecologia e a consciência urgente da necessidade imperativa da salvaguarda ecológica do planeta são exclusivos da "esquerda".
É por isto que eu afirmo claramente aqui que já sei em quem não vou votar... E, ao contrário do prof. Carmona,
digo-o: não vou votar no triunvirato Costa-Zé-Roseta.
Em quem vou votar, como muitos, não sei...
Portanto, apelos aos restantes para me convencerem, dizendo desde já que:
- não quero mais trapalhadas urbanísticas com histórias de permutas, trocas, baldrocas;
- não quero, pelo menos no primeiro mandato, mais obras públicas com orçamentos "em derrapagem";
- não quero mais encomendas a arquitectos do star system, a cobrarem fortunas por "maquetas" feitas de caixas de sapatos;
- não quero mais destruição do património arquitectónico, através da especulação imobiliária ou da "criatividade" corporativa dos arquitectos, não só nas avenidas românticas, mas em toda a Lisboa. Isto implica Largo do Rato, Terreiro do Paço, etc, etc.
Quero:
- reabilitação, reabilitação, reabilitação... urbana, com responsabilidade técnica e grande rigor na perspectiva da salvaguarda do património;
- a Baixa classificada como Património Mundial e a respectiva carta de valores e regras que isso implica;
- repovoamento do centro histórico;
- estratégia e planeamento na área do urbanismo comercial;
- gestão equilibrada na estratégia do trânsito e do estacionamento, incluindo uma Autoridade Metropolitana de Lisboa e um Regulamento de Cargas e Descargas;
- gestão dos espaços verdes;
- ao menos, a existência de uma política cultural e museológica para a cidade de Lisboa.
Bem, não tenho mais espaço... Acima de tudo, viva Lisboa! Lisboa merece mais.
Historiador de Arquitectura



Associação cívica desencadeia acção popular em tribunal contra o “mono do Rato”
Ana Henriques
14/04/2011

Iniciativa do movimento Salvem o Largo do Rato pede a anulação do licenciamento de imóvel projectado por Frederico Valsassina e Manuel Aires Mateus
O polémico projecto para construir um edifício de grandes proporções num dos cantos do Largo do Rato sofreu novo revés: uma associação cívica desencadeou uma acção popular destinada a anular o licenciamento camarário da obra, que ainda não arrancou.

A recém-criada associação Salvem o Largo do Rato argumenta que a Câmara de Lisboa violou normas legais ao permitir, no topo da Rua do Salitre, a construção de um imóvel que “motivou a repulsa da população de Lisboa”, ao ponto de o projecto ter ficado conhecido como “mono do Rato”. Foi entregue na Assembleia da República uma petição contra o edifício com mais de 5000 assinaturas. “Actos administrativos ilegais (...) resultaram no licenciamento de uma edificação que na sua inserção urbana se traduz numa violenta afronta a vários normativos do Plano Director Municipal de Lisboa”, refere a acção popular.
São vários os exemplos apresentados ao Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa: no Largo do Rato “predominam edifícios com uma altura média entre os nove e os dez metros”, mas “o projecto de arquitectura aprovado permite que a nova construção venha a ter uma altura superior a 17”; o projecto “viola grosseiramente” a regra que limita a altura máxima de um edifício consoante a largura das ruas confinantes; e até a largura prevista para a empena do imóvel “aproximase dos 39 metros”, quando, segundo a associação, não podia ir além dos 15. Consequências? “O prédio cria uma barreira perpendicular” relativamente aos edifícios vizinhos, “eliminando a possibilidade de insolação e ventilação naturais”. Ou seja, o edifício “não é apto para habitação”, porque “irá condenar a uma situação de insalubridade não só os logradouros confinantes” – os quintais dos outros prédios – como também os próprios edifícios, uma vez que ficarão à sombra após o meio-dia e sem qualquer possibilidade de arejamento natural”.

Por fim, a associação critica a opção de “transformar a parte nobre da cidade num desencanto de betão”, apesar do valor patrimonial de vários imóveis próximos. A cinco metros dali fica o chafariz do Rato, classificado como monumento nacional. Com a sua “fachada monolítica (...) com acabamentos em lioz e vidro”, o projecto de Frederico Valsassina e Manuel Aires Mateus “traduz-se numa total ruptura estética e urbanística com a malha e edifícios envolventes”.

Licenciado pela primeira vez pela Câmara de Lisboa em 2005, o projecto para um bloco de apartamentos no Largo do Rato acabou por ser rejeitado pela mesma autarquia três anos depois. Os seus promotores imobiliários foram então para tribunal para fazer valer os seus direitos. Já em 2010 o município entrou em negociações com os promotores para aprovar outra vez o projecto, o que veio de facto a acontecer. O PÚBLICO tentou, sem sucesso, obter um comentário do vereador do Urbanismo, Manuel Salgado, ao surgimento desta acção popular.

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