segunda-feira, 6 de novembro de 2017

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EDITORIAL
Um mundo de hipócritas
Não, a utilização de offshores não é necessariamente ilegal. Mas é completamente imoral.

DIOGO QUEIROZ DE ANDRADE
5 de Novembro de 2017, 21:21

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Os offshores têm dois tipos de utilização: os criminosos e corruptos usam-nos para lavar dinheiro obtido de forma ilegal; muitos outros usam-nos, de forma legal, para esconder o que têm e fugir aos impostos. Estes mecanismos da finança internacional não servem para mais nada a não ser permitir que os ricos fiquem mais ricos e que os criminosos tenham a vida facilitada.

Por que é que ainda são legais? Porque as pessoas que encabeçam os Estados e as instituições internacionais beneficiam directamente deste estado de coisas — e de cada vez que se revelam os nomes por trás destes esquemas aparecem invariavelmente os poderosos do mundo. Não é preciso acreditar em teorias da conspiração e clubes de poderosos em que o destino do planeta é decidido para ter nojo da política que se pratica na maioria das instituições de poder, sejam elas governos ou empresas. Para ter nojo destes comportamentos basta ter consciência, virtude rara em quem manda.

Os offshores são o principal motor da desigualdade económica e social que se verifica no mundo. E, se essa desigualdade tem sido tradicionalmente Norte-Sul, o cenário já mudou: a globalização permitiu que as economias menos desenvolvidas recuperassem parte do atraso e hoje a desigualdade que mais cresce é a que destrói a classe média nas sociedades ocidentalizadas. Este tem sido o padrão no século XXI, marcado por uma longa crise financeira e uma política que asfixia os cidadãos comuns com uma austeridade rigorosa, ao mesmo tempo que se permitem — e incentivam — mecanismos que enriquecem ainda mais os poderosos.

Seria de esperar que a União Europeia, sempre tão pronta a aplicar receitas que empobrecem despudoradamente os seus cidadãos, tivesse coragem para criminalizar as relações com offshores. Seria de esperar que um governo que se diz de esquerda — ou qualquer governo que se diga de bem — recusasse ter um offshore (perdão, uma zona franca) no seu território. Mas não é isso que acontece, nem em Portugal nem nos outros países europeus, nem nas instituições internacionais. Já que não são capazes de acabar com os offshores, acabem ao menos com a hipocrisia.

Uma última nota: mais uma vez foi a imprensa, numa notável investigação lançada por um jornal alemão, a descobrir e a destacar este escândalo de proporções mundiais. Quem ataca a imprensa livre quer precisamente evitar que este tipo de informações chegue ao grande público.


Em relação a Madonna, a cantora norte-americana a residir actualmente em Portugal, a investigação do consórcio internacional cita documentos da Appleby que referem um investimento feito em 1998 em acções da SafeGard Medical Limited, uma companhia com sede nas Bermudas, em nome de Shari Goldschmidt.


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