segunda-feira, 23 de novembro de 2015

Cavaco impõe seis condições para indigitar Costa / Presidente volta a receber António Costa nesta terça-feira em Belém / Candidatos a Belém apoiam Costa, só Neto admite eleições antecipadas


Cavaco impõe seis condições para indigitar Costa
Nuno Sá Lourenço 23/11/2015 – PÚBLICO

Presidente exige “clarificação formal” a Costa. Líder socialista saiu de Belém em silêncio.

A Presidência da República divulgou na manhã desta segunda-feira um documento que entregou a António Costa em que exige garantias adicionais sobre seis questões políticas que considerou estarem “omissas” nos acordos assinados pelo PS com os partidos à esquerda.

Cavaco Silva apresentou ao secretário-geral do PS, António Costa, um conjunto de exigências relativas aos acordos com a esquerda que, para Cavaco Silva, “suscitam dúvidas quanto à estabilidade e à durabilidade de um governo minoritário do Partido Socialista”. Essa “clarificação”, conforme foi assumida num documento escrito entregue a António Costa, refere-se a um conjunto de questões políticas que o Presidente considerou estarem “omissas” nas posições conjuntas assinadas entre PS, BE, PCP e Verdes.

Cavaco Silva pediu assim a Costa que desse outras garantias em relação à “aprovação de moções de confiança”, “aprovação dos Orçamentos do Estado, em particular o Orçamento para 2016”, o “cumprimento das regras de disciplina orçamental aplicadas a todos os países da zona euro e subscritas pelo Estado português.

Desde logo as que resultam do Pacto de Estabilidade e Crescimento, do Tratado Orçamental, do Mecanismo Europeu de Estabilidade e da participação de Portugal na união económica e monetária e na união bancária”, o “respeito pelos compromissos internacionais de Portugal no âmbito das organizações de defesa colectiva”, o “papel do Conselho Permanente de Concertação Social, dada a relevância do seu contributo para a coesão social e o desenvolvimento do país” e a “estabilidade do sistema financeiro, dado o seu papel fulcral no financiamento da economia portuguesa”.

A audiência do secretário-geral do PS com o Presidente da República terminou esta segunda-feira ao fim de meia hora. António Costa saiu de Belém sem fazer qualquer declaração. O encontro segue-se às 31 audiências realizadas por Cavaco Silva desde 12 de Novembro com confederações patronais, associações empresariais, centrais sindicais, banqueiros, economistas e partidos políticos.

As audiências no Palácio de Belém tiveram início dois dias depois da aprovação por toda a oposição de uma moção de rejeição ao programa do Governo de coligação PSD-CDS/PP, liderado por Pedro Passos Coelho que implicou a demissão do executivo.

As condições exigidas por Cavaco Silva ao PS, BE, PCP e PEV são semelhantes às que foram acordadas entre o PSD e o CDS, tanto em 2011 como em 2015. O acordo de coligação de governo assinado entre Passos Coelho e Paulo Portas, três dias após as legislativas de 4 de Outubro, prevê que as duas bancadas parlamentares aprovem Orçamentos do Estado, moções de confiança e de censura, e “iniciativas de suporte ao cumprimento das obrigações decorrentes da participação de Portugal na união económica e monetária”.

No texto do acordo, o PSD e o CDS reiteram o compromisso com o projecto europeu e com a moeda única, bem como o respeito pelas regras do Tratado Orçamental e com as que se relacionam com o semestre europeu.

O documento na íntegra:

"Presidência da República divulga documento entregue ao Secretário-Geral do Partido Socialista

O Presidente da República recebeu hoje, em audiência, o Secretário-Geral do Partido Socialista, a quem entregou o seguinte documento contendo questões com vista a uma futura solução governativa:

Face à crise política criada pela aprovação parlamentar da moção de rejeição do programa do XX Governo Constitucional que, nos termos do artigo 195 da Constituição da República Portuguesa, determina a sua demissão, o Presidente da República decidiu, após audição dos partidos políticos representados na Assembleia da República, dos parceiros sociais e de outros agentes económicos, encarregar o Secretário-Geral do Partido Socialista de desenvolver esforços tendo em vista apresentar uma solução governativa estável, duradoura e credível.

Nesse sentido, o Presidente da República solicitou ao Secretário-Geral do Partido Socialista a clarificação formal de questões que, estando omissas nos documentos, distintos e assimétricos, subscritos entre o Partido Socialista, o Bloco de Esquerda, o Partido Comunista Português e o Partido Ecologista 'Os Verdes', suscitam dúvidas quanto à estabilidade e à durabilidade de um governo minoritário do Partido Socialista, no horizonte temporal da legislatura:

a) aprovação de moções de confiança;
b) aprovação dos Orçamentos do Estado, em particular o Orçamento para 2016;
c) cumprimento das regras de disciplina orçamental aplicadas a todos os países da Zona Euro e subscritas pelo Estado Português, nomeadamente as que resultam do Pacto de Estabilidade e Crescimento, do Tratado Orçamental, do Mecanismo Europeu de Estabilidade e da participação de Portugal na União Económica e Monetária e na União Bancária;
d) respeito pelos compromissos internacionais de Portugal no âmbito das organizações de defesa colectiva;
e) papel do Conselho Permanente de Concertação Social, dada a relevância do seu contributo para a coesão social e o desenvolvimento do País;
f) estabilidade do sistema financeiro, dado o seu papel fulcral no financiamento da economia portuguesa.

O esclarecimento destas questões é tanto mais decisivo quanto a continuidade de um governo exclusivamente integrado pelo Partido Socialista dependerá do apoio parlamentar das forças partidárias com as quais subscreveu os documentos 'Posição Conjunta sobre situação política' e quanto os desafios da sustentabilidade da recuperação económica, da criação de emprego e da garantia de financiamento do Estado e da economia se manterão ao longo de toda a XIII legislatura."

Presidente volta a receber António Costa nesta terça-feira em Belém
SÃO JOSÉ ALMEIDA e PAULO PENA 23/11/2015 - 14:05 (actualizado às 22:42) PÚBLICO

Carta de resposta do líder socialista às seis exigências de Cavaco Silva já seguiu para Belém. PS, BE e PCP não voltaram a reunir-se, ficando-se apenas por contactos telefónicos antes da resposta por escrito ao Presidente.

O Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva, vai receber novamente o secretário-geral do PS, António Costa, nesta terça-feira, às 11h, no Palácio de Belém, segundo a agenda do chefe de Estado divulgada na noite desta segunda-feira.

Esta nova audiência acontece depois de o secretário-geral do PS, ter respondido, por escrito, às seis clarificações, em relação aos acordos que assinou com o BE, o PCP e o PEV, que lhe foram pedidas pelo Presidente da República, na audiência que com ele manteve na manhã desta segunda-feira no Palácio de Belém, em Lisboa.

O PS não irá, porém, divulgar a carta e respeitará institucionalmente o Presidente da República. De acordo com as informações recolhidas pelo PÚBLICO, se alguém quiser tornar públicas as respostas, terá de ser o próprio Cavaco Silva.

Costa contactou, telefonicamente, os líderes dos restantes partidos de esquerda com quem assinou os acordos que viabilizam a sua entrada em funções. No entanto, nem o PS, nem o BE, nem o PCP viram necessidade de qualquer reunião formal para acertar uma resposta ao comunicado tornado público pelo Presidente. Aliás, a leitura feita por alguns dirigentes aponta para um "recuo" de Cavaco Silva, que, agora, apesar de tudo, "já reconhece a hipótese de um governo do PS apoiado à esquerda no Parlamento".

Ao princípio da tarde, o presidente do PS e líder parlamentar, Carlos César, declarou ao Diário Económico: "Vamos responder por escrito, creio que há condições para enviar respostas ainda hoje." "Nenhuma das perguntas tem qualquer grau de dificuldade, foram todas respondidas nas últimas semanas, é só relembrar o que foi dito."


À TSF, o presidente do PS explicou ainda que "todas as questões que o Presidente da República coloca são questões que têm feito parte do debate político diário e que têm sido esclarecidos pelo próprio líder do partido ou outros dirigentes do PS”.

Candidatos a Belém apoiam Costa, só Neto admite eleições antecipadas
LUSA e PÚBLICO 23/11/2015 - 17:34 (actualizado às 19:39) / PÚBLICO

Marcelo Rebelo de Sousa classifica exigência de Cavaco como “estranha” e “insólita”, Sampaio da Nóvoa fala de medidas “excessivas” e Henrique Neto pondera avançar para eleições antecipadas caso chegue à Presidência.

Nenhum dos candidatos à Presidência da República que já se pronunciaram deixou incólume o actual detentor do cargo. Marcelo Rebelo de Sousa considerou “estranha e insólita” a exigência de Cavaco Silva ao PS relativa ao sistema financeiro, criticando o facto de levantar dúvidas sobre a estabilidade do mesmo.

"Parece-me bem a exigência de que a base de apoio garanta a confiança ao Governo, parece-me bem a garantia da aprovação do primeiro orçamento, parece-me estranha a exigência relativa ao sistema financeiro, falando da situação e do equilíbrio do sistema financeiro. Deixa dúvidas sobre se o sistema financeiro está neste momento em crise, que não está", disse Marcelo de Rebelo de Sousa aos jornalistas, em Lisboa.

Na opinião do ex-líder do PSD, "o Presidente da República deve ser a última instituição a levantar a questão da necessidade do equilíbrio do sistema financeiro", considerando "uma coisa insólita" o facto de se levantar esse tema.

"Eu acredito que rapidamente haverá uma resposta do secretário-geral do PS a estas exigências e portanto acredito que possa haver finalmente um Governo que governa e finalmente condições para se preparar um Orçamento, que é o que o país neste momento precisa", antecipou ainda.

Marcelo Rebelo de Sousa não põe "sequer a hipótese" que isto não aconteça e considera que "certamente que haverá condições para confiança no Governo, para aprovação do Orçamento" e que serão respeitados a Constituição e os compromissos internacionais e a Concertação Social, defendendo que "um futuro Governo não vai criar crise no sistema financeiro".

"Não há dissoluções antecipadas. Nenhum Presidente da República - e o mesmo é dizer nenhum candidato presidencial - pode em seu pleno juízo dizer que vai ou não vai dissolver o parlamento daí a tantos meses ou a tantos anos. É uma decisão que só pode ser tomada verificadas situações de crise que já expliquei quais eram e avaliadas no momento adequado", respondeu ainda, considerando que antecipar esses cenários é "uma insensatez para qualquer candidato presidencial".

Exigências "excessivas" e despropositadas"
Também Sampaio da Nóvoa considerou algumas das exigências do Presidente da República como “excessivas” e “despropositadas”, apesar de ver a reunião de Cavaco com Costa desta segunda-feira de manhã como uma “pré-indigitação” do líder socialista.

"Esta pré-indigitação de António Costa, nas actuais circunstâncias políticas e na actual situação de maioria parlamentar, parece-me uma pré-indigitação normal e natural. Estas exigências parecem um pouco excessivas e, nalguns casos, até despropositadas. O exemplo mais típico é o da estabilidade do sistema financeiro, que é muito difícil concretizar neste momento, seja por quem for", afirmou Sampaio da Nóvoa.

Em declarações aos jornalistas na sua sede de candidatura, em Lisboa, Sampaio da Nóvoa argumentou ainda que, se as garantias à exigências não forem dadas - e em alguns casos "dificilmente podem ser dadas" -, a solução "tem de voltar a ser a mesma, porque é evidente que não há outra solução que não seja a indigitação de um governo liderado pelo PS".

O Presidente “contra poder”, segundo Edgar Silva
Edgar Silva, candidato do PCP, acusou Cavaco de assumir um "papel de contra poder" à revelia da Constituição e "degradar" a vida democrática ao fazer exigências ao líder socialista, António Costa. "O Presidente da República tem de respeitar a vontade do Parlamento e dos parlamentares porque sabe e, conhece bem, que foram assumidas razões e condições para a viabilização de uma solução de Governo. A não ser que o Presidente se queira aproximar de algo que não estaria longe de uma tentativa de golpe de Estado. Isso seria inaceitável e impensável, seria a subversão das regras básicas fundamentais estruturantes do Estado Democrático", disse, à margem de um encontro com artistas da Cooperativa Árvore, no Porto.

O papel de "contra poder" do chefe de Estado tem "dualidade de critérios", situação "inaceitável e incompreensível", realçou Edgar Silva, porque está a querer agora "impor um conjunto de condições a uma solução de governo" ao passo que não pensou na questão da "durabilidade" do executivo quando ingiditou Passos e Portas. Mais: "O Presidente da República está a bloquear decisões que são de outro órgão de soberania, violando grosseiramente os princípios da Constituição e criando enorme instabilidade", realçou o candidato.

Para Maria de Belém a questão é de calendário: o Chefe de Estado “está a adiar o inadiável. O país precisa urgentemente de um Governo.” Até porque, acrescentou, “existem as condições políticas e institucionais para nomear um novo primeiro-ministro. Tanto assim é que o Presidente encarregou o líder do PS de iniciar contactos nesse sentido."

Numa curta declaração na sua sede de campanha, em Lisboa, a socialista defendeu que o país “precisa de estabilidade política e institucional porque só nesse quadro é possível cumprir todos os compromissos internacionais e assegurar a satisfação das necessidades de todos e cada um dos portugueses".

Henrique Neto quer novas eleições se acordo não for reforçado
Em comunicado enviado às redacções, Henrique Neto vinca que “as decisões do Presidente da República criaram uma divisão desnecessária e dúvidas sobre a legitimidade das escolhas feitas, há que procurar uma solução que possa ser apoiada por todos os portugueses e seja constitucionalmente irrepreensível".

E prossegue: "O Presidente da República deve de imediato convidar António Costa a formar Governo, mas dando a nota de que o faz porque a alternativa seria não haver Governo até Setembro do próximo ano."

Henrique Neto deixou ainda um recado final – se o PS não reforçar o acordo feito com os partidos à sua esquerda para uma estratégia de médio prazo para Portugal, não se compromete a segurar o Governo: “Posso garantir que se um tal acordo não for conseguido, que garanta a estabilidade (…) convocarei novas eleições que permitam aos portugueses resolver o imbróglio que a imprevidência presidencial e as diversas ambições partidárias criaram."

Sobre a hipótese de dissolução do Parlamento, Marcelo é bastante claro: “Não há dissoluções antecipadas. Nenhum Presidente da República ou candidato pode, em seu pleno juízo, dizer que vai ou não vai dissolver o Parlamento seis meses antes. É uma insensatez para qualquer candidato a Presidente”, diz, citado pelo Observador.

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