domingo, 15 de novembro de 2015

Ataques em Paris aproximam Obama e Putin na reunião do G20


Ataques em Paris aproximam Obama e Putin na reunião do G20

ALEXANDRE MARTINS 15/11/2015 - PÚBLICO

Presidentes dos EUA e da Rússia falaram durante 35 minutos à margem da reunião na Turquia e disseram que "é ainda mais urgente" encontrar uma solução para a guerra na Síria.

Os ataques terroristas cometidos em Paris em nome dos extremistas do Estado Islâmico vieram alterar de forma radical as conversações internacionais que estavam agendadas para este fim-de-semana, tanto na Áustria, no sábado, como na Turquia, domingo e segunda-feira. Numa imagem que se tornou rara desde o início da guerra no Leste da Ucrânia, há quase dois anos, Barack Obama e Vladimir Putin estiveram à conversa mais de meia hora, em privado, num diálogo considerado "construtivo" por Washington.

O conteúdo da conversa não foi revelado, mas a fotografia partilhada na rede social Twitter pela representante russa na reunião do G20 na Turquia, Svetlana Lukash, adquiriu rapidamente o estatuto de imagem icónica: num canto reservado do hotel Regnum Carya, em Antalya, Obama e Putin estão sentados frente a frente, quase colados um ao outro, com expressões graves e a ouvirem atentamente o que um e outro têm para dizer.


As manifestações de esperança numa aproximação de posições sobre o que fazer para travar os extremistas do Estado Islâmico no Iraque, mas principalmente na Síria, não se fizeram esperar. A própria representante russa partilhou uma mensagem de um utilizador do Twitter que ficou bem impressionado com a fotografia: "Uma imagem rara de dois líderes mundiais com pontos de vista diferentes a discutir assuntos como adultos. O mundo precisa de mais momentos como este."

As declarações oficiais sobre a conversa entre Obama e Putin, que demorou cerca de 35 minutos, dão conta de uma conversa construtiva, apesar das já conhecidas diferenças.

"O Presidente Obama e o Presidente Putin concordaram com a necessidade de haver uma transição política liderada pelos sírios, que seria antecedida por negociações mediadas pelas Nações Unidas entre a oposição síria e o regime, para além de um cessar-fogo", disse à agência Reuters um representante da delegação dos Estados Unidos, sob a condição de anonimato. Segundo o mesmo responsável, Obama salientou a importância de a intervenção russa na Síria se concentrar no combate ao Estado Islâmico – uma das críticas que são feitas ao envolvimento da Rússia é que as suas forças têm atacado também os grupos de rebeldes que combatem o Exército sírio de Bashar al-Assad.

Do lado russo, o diplomata e conselheiro do Kremlin Iuri Ushakov (que foi embaixador da Rússia em Washington entre 1999 e 2008) disse que "os objectivos estratégicos em relação ao combate contra o Estado Islâmico são, numa questão de princípios, muito similares, mas há diferenças na vertente táctica" – por outras palavras, tanto a Rússia como os EUA querem destruir as forças do Estado Islâmico, mas não se entendem quanto ao caminho para lá chegar.

Num comentário à declaração final do grupo internacional de apoio à Síria, que se reunira no sábado, em Viena, Barack Obama levantou o pé do acelerador nas críticas à intervenção da Rússia na Síria, apesar de não haver qualquer indicação de que os dois países possam vir a coordenar-se directamente. O Presidente dos EUA salientou o envolvimento de todos os países nos ataques contra os extremistas do Estado Islâmico, e salientou "a importância dos esforços militares russos na Síria centrados nesse grupo".

Coube ao presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, deixar um alerta contra a estratégia russa de não se limitar a atacar o Estado Islâmico, no seu apoio ao Presidente Bashar al-Assad: "Precisamos de mais cooperação, mas também de mais boa vontade, especialmente por parte das acções russas na Síria. Devem centrar-se no Estado Islâmico, e não na oposição síria moderada."

Tusk acusou a estratégia russa de instigar "uma nova vaga de refugiados" para a Europa. "Temos alguns sinais de que isso está de facto a acontecer", disse o presidente do Conselho Europeu.

Mesmo que não tenham sido discutidos pormenores sobre os próximos passos, é revelador do novo clima criado pelos ataques em Paris que Obama e Putin tenham dito um ao outro que "é ainda mais urgente" encontrar uma solução para a guerra na Síria, que já fez mais de 250.000 mortos, sete milhões de deslocados e mais de quatro milhões de refugiados em quatros anos e meio.

Apesar da aproximação entre os dois líderes (suficiente para que pudessem conversar à margem de uma reunião formal, algo raro nos dias que correm), de Washington não chegam indicações de que a política norte-americana irá sofrer alterações significativas – ainda que os ataques em Paris tenham levado as autoridades francesas a pressionar a Casa Branca para reforçar o seu envolvimento na Síria.

Em declarações ao jornal The Washington Post, um dos conselheiros de segurança nacional de Barack Obama, Ben Rhodes, disse que o caminho é outro – pelo menos por agora.

"Não acreditamos que as tropas americanas sejam a resposta para o problema", disse o conselheiro, referindo-se ao possível envio de soldados norte-americanos para o terreno na Síria, uma decisão que o Presidente Barack Obama afastou desde que ordenou os primeiros ataques aéreos, mas para a qual tem sido pressionado a olhar cada vez com mais abertura.

"O envio de mais tropas americanas para entrar num combate em larga escala no Médio Oriente não é a melhor forma de lidar com este desafio", afirmou Ben Rhodes, repetindo a política oficial da Casa Branca. Em vez disso, sublinhou o conselheiro de Barack Obama, os ataques terroristas em Paris "podem servir para criar um maior sentimento de urgência na comunidade internacional para o apoio aos vários elementos da campanha anti-Estado Islâmico, e para uma solução diplomática no conflito sírio".


Apesar de aparentemente pouco se ter alterado, o encontro entre os Presidentes da Rússia e dos EUA dominou o primeiro de dois dias da cimeira do G20, em Antalya, onde os ataques terroristas em Paris adquiriram um protagonismo que passou a rivalizar com o tema principal da agenda: a discussão de medidas para lidar com a chegada à Europa de centenas de milhares de cidadãos de países africanos, do Médio Oriente e asiáticos, a maioria em fuga da guerra na Síria e da violência e perseguição no Iraque, Afeganistão, Paquistão ou Eritreia.

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