segunda-feira, 18 de maio de 2015

Ainda a década de estagnação prometida pelo PS


Ainda a década de estagnação prometida pelo PS
AGOSTINHO LOPES 18/05/2015 - 06:40

O Documento do PS é um albergue espanhol, e permite todas as leituras.

Pedro Nuno Santos (PNS) veio justificar “Uma Década”, em entrevista ao PÚBLICO (2MAI15). Tenta contrariar a ideia de que o Documento não representa “mais um desvio neoliberal” do PS. A necessidade da justificação e de mostrar a diferença face ao PSD/CDS é tanta, que Francisco Assis já vai em dois artigos, Correia de Campos noutros dois, e etc… E só no PÚBLICO! O sobressalto tem razão de ser, porque a evidência é demasiada…

O Documento é um albergue espanhol, e permite todas as leituras: de esquerda (com algum “esforço”), de direita, e do centro. Mas, segundo esses “especialistas”, sempre a quilómetros do programa PSD/CDS!

Tal é feito à custa de alguns truques. O dos dois cenários, o cenário bom, “credibilidade reforçada do projecto europeu”, e o cenário mau, “crise europeia profunda e prolongada”. Sem que ninguém se dê ao trabalho de explicar por que razão é o cenário optimista o escolhido. Aliás, menos que ninguém, PNS o devia avalizar, pois justamente critica o caminho de Hollande na França e de Renzi na Itália, cumprindo programas de austeridade e exigindo/impondo aos gregos a dose reforçada! O truque do documento “técnico”, texto “não político”, “não é a Bíblia”, onde é possível enxertar vários programas. O truque da União Europeia (por vezes confundida com Europa), lugar apolítico, lugar não de confronto e afrontamentos sociais e políticos, de classe e nacionais, mas um “estado de graça” de sociais-democratas e conservadores e outros, onde nada se passa… Nada como a clareza de Teresa de Sousa: “o PS está onde sempre esteve…”, “governar ao centro e aceitar a ordem europeia” (PÚBLICO 26ABR15)!

“Sou (PNS) a favor da renegociação da dívida pública. Continuo a achar que ela é essencial para Portugal se libertar da austeridade e iniciar uma trajectória de recuperação económica”. Então como é? É ou não possível o fim da austeridade e o crescimento económico sem renegociação, como se estabelece no Documento??? É essencial ou não para Portugal? Porque, por exemplo, para João Galamba (JG), era mas já não é! A 1FEV14 (Dinheiro Vivo/JN/DN): “Agora uma coisa é certa, a dívida é insustentável (…)”.“Agora que ela é impagável e (…) um enorme entrave ao crescimento económico, disso não tenho a menor dúvida”. Afinal para JG já não é certo e já tem dúvidas…

Como compatibiliza PNS o cenário “optimista”, tendo como pano de fundo o cumprimento de todas as “restrições associadas à participação activa de Portugal na construção da área do euro” (desde o Tratado Orçamental à não reestruturação da dívida pública) e consegue, simultaneamente, o crescimento sustentado do PIB, o equilíbrio estrutural das contas públicas, a redução do endividamento (dois objectivos com prioridade, “independentemente dos condicionalismos externos”), o aumento do emprego e a melhoria das condições de vida de toda a população??? De facto, é a continuação da austeridade que se promete.

Não vê o “desvio neoliberal” quando não há reversão/atenuação da desigualdade capital/trabalho, fortemente agravada, durante os anos da Troika? Tal não acontece na distribuição do rendimento. Bem pelo contrário, redução das remunerações salariais! Tal não acontece na desigualdade de poder na relação laboral na empresa. Bem pelo contrário, com a facilitação do despedimento individual.

E no ataque à natureza e sustentabilidade da Segurança Social, com a baixa da TSU (8 pontos percentuais), o plafonamento vertical nas contribuições dos trabalhadores, o regresso ao “Fundo de Desemprego”? Acresce o possível aumento da idade de reforma e redução das pensões, face à prometida reavaliação do factor de sustentabilidade.

A “estabilidade”, erigida em grande princípio da política fiscal do PS. Ora, como compatibiliza NPS tal “princípio” com a urgência de uma radical reforma fiscal. E sobre a eliminação da sobrecarga e injustiça fiscais da Troika/PSD/CDS?

Outras cinco questões descobrem a continuidade quase absoluta face ao PSD/CDS: no Ensino, nas Privatizações, na Administração Pública, na abordagem das MPME! E uma pérola: “(…) o estabelecimento de regiões com algum grau de legitimidade democrática é, pelo menos no curto prazo, politicamente inviável.” A regionalização é “politicamente inviável”?

A disponibilidade do PCP é total para um governo de ruptura com as políticas de direita. Como parecia querer alguma gente no PS! Não para a continuidade da austeridade e empobrecimento do País. Não para a estagnação, retrocesso económico e social e a manutenção de uma dinâmica de desigualdades sociais e regionais. Não é a Europa que nos separa. É a corrosão da soberania nacional e do próprio regime democrático pelas estruturas e políticas da União Europeia, é a renegociação da dívida, é a desvalorização do trabalho e dos trabalhadores, são os ataques à Segurança Social, é a injustiça fiscal… Sobre o PCP e o Euro, PNS pode esclarecer-se definitivamente, lendo os documentos do PCP, inclusive um Projecto de Resolução que debateu na AR.


Membro do Comité Central do PCP

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