sábado, 17 de janeiro de 2015

Passos admite “revisão de acordo técnico” das Lajes

( ...) A China tem hoje mais influência em Portugal do que tinha antes de 2011…
Sim, claramente.  A influência é hoje muito mais significativa, não só em termos económicos mas também porque é hoje evidente que a China, que consolidou a sua posição quanto actor global, está activamente a construir a sua presença no Atlântico sul e no Atlântico no seu conjunto. Já manifestou, perante a desactivação da Base das Lajes e a retirada norte-americana, vontade de ocupar essa posição. E a questão dos Açores, que está claramente em cima da mesa, não se reduz à questão das Lajes, embora para a China ter uma base militar no coração da NATO seria algo muito relevante. Há uma outra questão central, na procura da China por recursos naturais, pelo seu controlo, que é a plataforma continental portuguesa.

Também estão interessados?
Há um interesse enorme, e a aproximação aos Açores também tem a ver com isso. Por parte da China, há uma clara compreensão de que Portugal não tem capacidade financeira para explorar os recursos da plataforma continental, e a capacidade tecnológica também não é suficiente. Da mesma forma, há a percepção de que a Europa vai ser lenta e que a resposta concertada não vai chegar a tempo. Assim, perfilam-se como o parceiro privilegiado.

Estamos a falar de que tipo de recursos a explorar? Pescas?
A questão da pesca é hoje essencial para a China, que tem de garantir a alimentação de uma população crescente. Muitos dos conflitos territoriais onde está envolvida, nomeadamente com o Japão, têm a ver também com os recursos piscícolas. A China sabe que, perante os riscos de insegurança alimentar a que está sujeita, tem de garantir essa fonte de abastecimento. Mas há também a questão dos recursos naturais, de exploração do subsolo, que implica investimentos muito significativos. A prazo, esse é também um objectivo estratégico chinês. Se tiverem uma posição forte na economia portuguesa, ficam com condições para condicionar, de forma significativa, as decisões que forem tomadas nessa matéria.”
Miguel Santos -  PÚBLICO - 17/11/2014

Passos admite “revisão de acordo técnico” das Lajes
Primeiro-ministro viu-se atacado por todos os lados no debate quinzenal. TAP, PT, desemprego, impostos. Conseguiu ir apresentando respostas. Excepto para a falta de médicos nos hospitais
Nuno Sá Lourenço / 17-1-2015 / PÚBLICO

O primeiro-ministro aproveitou o debate quinzenal de ontem para criticar os EUA a propósito da redução na Base das Lajes. Comentando a situação, Pedro Passos Coelho ouvia de Washington “muito verbo e pouca acção” sobre a possibilidade de aplicação de medidas para mitigar o impacto socioeconómico da redução na Base das Lajes, nos Açores. O chefe do Governo admitiu mesmo que o anúncio poderá “suscitar a revisão do acordo técnico” que regula a permanência militar americana na ilha Terceira.
O acordo técnico foi um dos documentos oficiais assinados entre os dois Estados em 1995. Nele se fixaram as regras de utilização da base, os procedimentos a levar a cabo para as aeronaves em trânsito — quando os EUA teriam de solicitar autorização ou apenas avisar as autoridades portuguesas —, o pagamento dos custos de operação e manutenção na base, o número máximo de pessoal americano destacado, militar e civil (6500) e a concessão de facilidades no porto da Praia da Vitória. Esse acordo prevê ainda a facilitação de recursos locais aos americanos, isenção de taxas na importação de equipamentos, abastecimentos e material para uso da força militar. O acordo permite até isenção do IVA de material e serviços portugueses. No início deste mês, a Administração Obama confirmou que a racionalização de efectivos militares na Europa aplicar-se-ia também às Lajes, com a redução dos actuais 600 para 165 norte-americanos e o corte de trabalhadores portugueses de 800 para 400.
As declarações de Passos Coelho surgiram após uma pergunta do líder parlamentar do PSD, Luís Montenegro, sobre o que se poderia fazer para “evitar as consequências” económicas da redução. Passos anunciou a criação de uma comissão, a juntar os governos da República e o regional, “para encontrar medidas que possam atenuar” esse impacto e “revitalizar a economia da ilha”.
Passos Coelho defendeu no Parlamento que as consequências iriam ter “um peso muito negativo” na ilha e Açores e que essa era uma realidade “a que os EUA não podem deixar de atender”. E acrescentou que o “Governo não aprecia” a forma como a administração tinha gerido a questão “ao longo dos vários anos”.
O desejo de um empenho conjunto dos diferentes partidos na defesa da posição portuguesa, manifestado por Montenegro, não se reflectiu, no entanto, neste debate. O PS criticou a reacção do Governo ao anúncio feito a 8 de Janeiro, denunciou o “isolamento atlântico” e o “tratamento vexatório” de que o país fora alvo. O que levou o primeiro-ministro a criticar o PS por utilizar a questão “como arma de arremesso político”.
As Lajes foram apenas um dos muitos temas através dos quais o primeiro-ministro foi metralhado pela oposição. Na maior parte dos embates, Passos Coelho foi conseguindo responder aos ataques, à excepção de um tema. Na saúde, o chefe do executivo revelou maiores dificuldades para contrariar as críticas. Todos os partidos da oposição lembraram a falta de médicos nos hospitais. Heloísa Apolónia, dos Verdes, deu o tiro de partida ao afirmar que havia “gente a morrer nas urgências deste país”, apontando a responsabilidade aos cortes efectuados no sector.
O chavão da austeridade regressava. “As consequências das políticas de austeridade estão à vista. O Governo preferiu cortar nas escalas, reduzir nos vencimentos, recrutar médicos sem ligação aos hospitais”, insistia Ferro Rodrigues. A única resposta que Passos conseguiu articular foi repescar o passado. “Pensei que se referia ao pagamento de dívidas que os senhores deixaram. Conseguimos pagar parte do passivo e de dívidas e capitalizar alguns hospitais. Apesar das restrições, não puseram em causa os serviços prestados”.
Ainda assim, nos restantes temas, Passos foi conseguindo apresentar respostas às críticas. O PCP acusou o Governo de, com os seus planos para a requalificação, ter criado a “antecâmara” para despedimentos. Por começar “nos cortes nos salários, numa autêntica chantagem” a que depois juntava os números distorcidos.
O líder comunista, Jerónimo de Sousa, acusou o Instituto Emprego e Formação Profissional (IEFP) de distorcer “as estatísticas”. “Lá se foram os sinais tão proclamados sobre as estatísticas do desemprego, as quais, desde que torturadas e retorcidas, dizem sempre aquilo que se pretende”, afirmou, classificando de “inquietantes as tendências” anunciadas de “despedimentos no sector financeiro, na Base das Lajes, na TAP”, entre outras.
Passos Coelho já antes reconhecera preocupação com os números do desemprego. “Houve um aumento do valor do índice, e isso evidentemente preocupa o Governo”, disse o chefe do executivo, para depois se manifestar esperançoso de que os mais recentes valores fossem apenas um contratempo: “Não estou certo de que isto transmita uma inversão de tendência, mas precisamos de estar atentos”.
PT e Novo Banco
Do BE, o foco foi para a PT. Catarina Martins desafiou o Governo a tomar uma posição na Portugal Telecom, insistindo no trunfo do Novo Banco. “Na quinta-feira, há uma nova assembleia geral de accionistas e é possível, usando Novo Banco, Segurança Social e pequenos accionistas, ter os 30% para parar a venda da PT à Altice. Que indicações é que o Governo vai dar aos administradores que vão estar nessa assembleia geral representando o Estado?”, interrogou a porta-voz do BE.
Sem surpresas, Passos disse que não levantaria um dedo. Para o social-democrata, o Estado não era “dono do Novo Banco”. “O Novo Banco foi criado com a resolução do BES, foi criado pelo Fundo de Resolução, o Fundo de Resolução não dá ordens à administração do Novo Banco em nome do interesse do Estado para que, na gestão dos interesses correntes do banco, os administradores votem de uma ou outra maneira”, vincou. Mas Catarina Martins ainda lembrou que quem estava a “meter dinheiro” era o Estado e, como tal, a administração tinha de “obedecer” às indicações desse accionista.

O posicionamento dos dois partidos do Governo sobre impostos foi também tema no debate. Ferro Rodrigues abordara o tema, mas uma intervenção do líder parlamentar do CDS permitiu ao primeiro-ministro sublinhar a “total sintonia dentro do Governo” na fiscalidade. Que foi usada, sublinhou depois, para “conseguir servir os objectivos” ambientais e de promoção da natalidade. Através do líder socialista, o PS ensaiou um discurso em que tentava apresentar o Governo “isolado” em relação ao resto do país. Não só em relação à política externa — a propósito das Lajes —, mas também nas reformas na justiça, nas urgências hospitalares, na requalificação e nas “discriminações positivas” em carreiras do Ministério das Finanças. “O senhor primeiro-ministro está isolado da administração pública e começam a sentir-se sinais de que as trapalhadas do seu Governo podem conduzir a um isolamento face às forças políticas que o sustentam”, sustentou. Na resposta, Passos Coelho argumentou que o executivo não trabalhava “com a preocupação de agradar”.

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