sábado, 17 de janeiro de 2015

Alexandre Soares dos Santos ao i. "A única coisa séria que existe em Portugal é o Partido Comunista"


Alexandre Soares dos Santos ao i. "A única coisa séria que existe em Portugal é o Partido Comunista"
Por Isabel Tavares
publicado em 17 Jan 2015 – in (jornal) i online

Diz que contrataria Sócrates para trainee, mas provavelmente teria de o despedir. Ficava com Pires de Lima, que convidou

Nunca gostou de finanças e diz que esse não é o seu número, mas o seu negócio são números e sempre a somar. O grupo Jerónimo Martins é o 62.o maior do mundo, segundo a Deloitte. Só no ano passado cresceu mais de 7% e está apenas em três geografias: Portugal, Polónia e Colômbia (há um ano e meio). No total emprega perto de 80 mil pessoas. No entanto, Alexandre Soares dos Santos nunca foi consultado por um político para nada. Falámos de quase tudo, a começar pela notícia do i do dia, o milhão que Carlos Santos Silva, amigo de Sócrates, tinha no cofre do Barclays e o "apartamento" do ex-primeiro-ministro em Évora, que "pagávamos antes e continuamos a pagar agora".

Impressionam-no, estas notícias?

Fico escandalizado e triste, principalmente. Tudo quebra a confiança das pessoas nos líderes políticos e temos de ter confiança em quem nos governa. É por isso que os jovens não querem discutir política, vão-se embora tristes com tudo.

Isso e porque não têm emprego...
A dificuldade de criação de emprego não é um problema português, é europeu. E é consequência das novas tecnologias. Antes, no cockpit de um avião iam quatro pessoas, hoje vão duas e uma parte é feita por computador. O problema é que os políticos desconhecem o mundo a que pertencemos. Não há fronteiras, ninguém tem direito a um emprego, trabalha-se onde houver trabalho. Mas é preciso especialização, seja carpinteiro, seja mecânico ou jurista. Neste ramo queremos talhantes, padeiros, gente para a peixaria, e não há ninguém em Portugal.

Não há pessoas para trabalhar?
Temos muita dificuldade. Já fomos à Alemanha buscar padeiros portugueses. Os que cá estão não são especializados.

Mas estão lá fora. Porquê?
Porque cá não tiram curso nenhum e lá são obrigados a fazê-lo. A sociedade portuguesa continua a não perceber que um chauffeur particular tem de ter um curso, não basta ter carta, é preciso ter até noções de segurança. Cá é o faz-tudo e o faz-tudo morreu. Somos refractários à mudança e por isso não conseguimos perceber os nossos problemas. Complicamos tudo. Estamos sempre a falar na protecção do trabalhador e se há coisa que em Portugal não se faz é proteger o trabalhador. Julga-se que isso é dar-lhe emprego para toda a vida.

E o que é proteger um trabalhador?
É dar-lhe boas condições de trabalho - cantina, assistência médica, creche - e uma boa remuneração. De resto, não cumpriu vai à vida, porque não tem direito de estar a tirar trabalho aos bons.

Como explica os baixos salários?
Vem da educação do empresariado, que não evoluiu. Hoje o grande concorrente do Pingo Doce não é o Minipreço ou a Tesco ou outro qualquer. É o consumidor, que tem liberdade de escolha e vai comprar onde tiver o melhor produto, ao melhor preço, com o melhor serviço.

Qual o salário médio no grupo JM?
Não há, existe por função. O mais baixo era de 786 euros em 2013, quando saí. O salário médio mais baixo na nossa companhia industrial Fima-Lever são 2 mil euros, não contando com prémios, e há poucos. Fala-se em desemprego, mas no ano passado construímos um centro de logística em Algoz, no Algarve. Perguntei ao construtor quem é que lá trabalhava: 70% vinha do Minho, 30% da Ucrânia. Algarvios zero. Também ninguém faz contas à taxa de absentismo, que em regiões como Lisboa e Algarve é enorme. Nos biscates e no fundo de desemprego está-se melhor. Há uma inversão de valores, mas preferimos culpar a troika, o défice, isto e aquilo, quando na realidade se trata de eficiência. Em Portugal não há diferença entre o bom e o mau.

Quais deviam ser as prioridades do governo?
Antes de mais, ter uma espécie de livro branco feito por grandes cabeças, portuguesas e estrangeiras, que analisasse o país por sector. Depois uma discussão e implementação sérias. Isto vai das políticas salariais às de educação.

Tivemos o estudo Michael Porter, duas vezes...
E não se fez. Os poucos que o seguiram, como os do calçado, estão hoje a crescer. É extraordinário, temos uma data de pessoas a falar sobre tudo e sobre nada, até temos um Tribunal Constitucional que se está a transformar numa força política, quando o que precisamos é de um grupo de pessoas competentes, que vejam a dez anos. E é isto que os partidos políticos não conseguem fazer. Outro dia ia no carro a ouvir na rádio uma senhora arquitecta, que foi candidata à Câmara de Setúbal, contar que trabalhar na Câmara de Lisboa tinha sido a maior frustração da sua vida. Não conseguiu fazer nada porque a câmara está dividida entre os que são do PSD e os que são do PS e esta gente detesta-se uma à outra. Isto é permitido? É dinheiro mal gasto.

Existe o exercício do poder mesquinho?
Aquela coisa do "você sabe quem eu sou"?

Também...
Soube de um caso recente de um tipo que chegou num avião particular, agarrou nos passaportes e foi ter com o polícia, que perguntou onde estavam os passageiros. A pessoa respondeu: "Não sabe quem eu sou?" Sei, disse o polícia, um viajante. Mandou buscar a família e abriu--lhes as malas todas. Isso está a mudar, por uma questão de formação, é mais igual. Portugal tem feito progressos extraordinários em muitos campos.

Por exemplo?
O Serviço Nacional de Saúde é muitíssimo bom. Eu e o meu chauffeur, em situações diferentes, já entrámos de urgência no Hospital de Santa Maria, sem cunhas, e foi impecável. Eu fiz uma angioplastia, ele foi operado à vesícula. Mas muitos portugueses entendem que o hospital, a maternidade, o médico, o advogado, o tribunal têm de estar à porta. Temos uma escola politécnica em Castelo Branco e outra em Portalegre. São 20 minutos de uma cidade à outra. Vale a pena gastar este dinheiro? Mas o acesso à educação, à saúde, à justiça é hoje o de um país civilizado normal em qualquer parte do mundo. Há coisas a funcionar muito mal? Há, claro.

Quais?
Os partidos políticos.

Em que é que funcionam pior?
Não querem descer ao país, não querem conhecer a realidade. A maior parte dos nossos ministros nunca trabalhou e isso é mau. É preciso saber como é o mundo. Se eu estivesse sentado no meu gabinete e não saísse quando era executivo estava dependente do que os outros me diziam. É preciso tirar a prova dos nove: eu tinha de ir às lojas, ao armazém, saber das pessoas, se os produtos estavam bons.

Teve surpresas?
Uma vez apareci num armazém à meia- -noite, depois de ouvir comentários a dizer que os frescos não estavam bons nas lojas. Fui ver se era verdade e era. Decidi verificar, à hora a que chegavam os produtos, o que se passava. Era o forrobodó total no armazém, jogava-se à bola com couves! Vim-me embora e julgaram que já não voltava, mas às sete da manhã estava lá outra vez. Foi tudo para a rua, a começar pelo director.

Os governos não fazem isso?
Nem sabem as consequências das suas decisões. Tive uma discussão com um ministro sobre o corte na minha reforma e ele dizia que era impossível. Fui obrigado a mostrar-lhe os recibos de 2011, 2012, 2013 e 2014.

Quem era?
Não digo.

E depois?
Depois nada, que quem é ministro não responde, não percebe que é pago por nós.

Como é o diálogo entre empresários e governo?
Não existe. Criam-se uns conselhos nacionais não sei de quê, em que estão uns presidentes da CIP, disto e daquilo, e que não conhecem nada. Mas chamar um empresário e perguntar-lhe o que pensa, quais vão ser as consequências desta decisão que querem tomar, isso não acontece.

Teve reuniões com algum governo?
Não.

Reuniu-se com políticos. De que falou?
Não, talvez um almoço ou um jantar...

Nunca nas reuniões para as quais são convidados os maiores empresários nacionais?
Não. Estive duas vezes com o Álvaro Santos Pereira, uma para lhe anunciar que íamos investir na Colômbia, outra por causa da fábrica do leite, que acabámos por comprar. O grupo Jerónimo Martins nunca fez parte de nada.

Porque é que acha que isso acontece?
Sei lá porquê, e quero lá saber, agora sou um reformado. E a mim, no Jerónimo Martins o que me preocupa é a criação de emprego, o crescimento da casa e torná- -lo cada vez menos dependente de Portugal.

E uma reunião em que Sócrates lhe disse que em 2020 estaríamos uma maravilha e Teixeira dos Santos respondeu que o drama era sobreviver até 2013?
Essa reunião foi marcada por mim. Reuni uma série de empresários, um grupo que não devia nada ao Estado, independente, para dizer que as coisas não iam bem em Portugal, estávamos cada vez pior e tínhamos por obrigação fazer qualquer coisa. Pedimos ao professor Daniel Bessa que, de acordo com um briefing, preparasse umas guidelines. Quando chegou a altura levantou-se a questão do que fazer com o resultado. O professor António Barreto dizia: informe-se o povo, caso contrário vai para o lixo. Ganhou a versão de informar o senhor primeiro-ministro. Ninguém leu e foi para o lixo na mesma.

Cartas ao governo, costuma escrever?
Sim.

A falar de quê?
A expor os meus problemas e aquilo em que acredito que deviam pensar.

Respondem-lhe?
O actual primeiro-ministro respondeu duas vezes. E um ministro de Sócrates, o da Administração Interna, Rui Pereira, também respondeu uma vez.

A decisão de levar a sede fiscal da empresa para a Holanda foi muito criticada. É traição à pátria?
É a sede fiscal da Sociedade Francisco Manuel dos Santos e não a da Jerónimo Martins que está na Holanda. A razão principal por que fomos para lá foi termos necessidade de acompanhar o crescimento do grupo Jerónimo Martins, no qual temos uma participação de 56%. Para isso precisamos de acesso à banca, que em Portugal não tem dinheiro. Quando nos dirigíamos a essa banca ficávamos à porta. Mas, já em 1994, quando fomos para a Polónia investimos via Holanda.

Porquê?
Em caso de nacionalização o governo holandês garante todos os investimentos feitos a partir da Holanda em países com os quais tem acordo. Esta garantia atrai investimento estrangeiro. Segundo, oferece estabilidade fiscal, que em Portugal não existe; tem o Orçamento Geral do Estado aprovado pelo parlamento, depois tem as interpretações dos secretários de Estado, depois as dos serviços. E se eu lhe mostrasse a conta em advogados é uma barbaridade. Quando fomos para a Colômbia fizemos um acordo com o governo de 13 anos de estabilidade fiscal. Cá seria impensável. Portanto, uma coisa é ser português, outra coisa é defender os interesses materiais da família. E esses estão protegidos lá fora, não estão protegidos cá dentro. Quando há um parlamento que está permanentemente a falar nas nacionalizações e não entende a iniciativa privada, o que é que espera que eu faça? Convido o senhor Jerónimo de Sousa para tomar pequeno-almoço? Não, vou-me embora.

A que bancos não tinham acesso antes de ir para a Holanda?
Àqueles com que agora trabalho e que me dão as linhas de crédito.

Quem são?
O Goldman Sachs, por exemplo.

Antes os bancos emprestavam dinheiro a quem precisava. Hoje precisam de emprestar, mas só a quem tem?
Há uma diferença entre bancos e banqueiros. Portugal teve banqueiros.

Hoje o que tem?
Hoje a forma de ver é completamente diferente e eu não gostaria de entrar nesse assunto. Posso estar a cometer grandes injustiças baseado em factos recentes... Mas é um motivo de preocupação ver que a banca portuguesa pode passar toda para mãos estrangeiras.

Isso aflige-o? Porquê?
Muito. Porque é necessário ter grandes empresas portuguesas e elas estão a desaparecer.

Acabou de dizer que teve de procurar financiamento na banca estrangeira...
Porque não temos cá dentro esses bancos estrangeiros.

A menos que comprem os bancos nacionais e apoiem as empresas portuguesas.
Duvido que esses grandes bancos venham. Se for um banco estrangeiro colocado em Portugal a comprar o BES, o que vai acontecer? Despedimentos, menos concorrência, perda de acesso aos mercados...

Haverá mais despedimentos se for comprado pelo BPI ou por um chinês?
Eu diria que se for um banco dos que já cá estão, eventualmente, os despedimentos serão maiores. Mas preferia que fosse um português, que desse origem a um grupo bancário forte. A ser estrangeiro, preferia um com grande qualidade de gestão.

O que aconteceu foi uma surpresa?
Não exactamente, já há muito tempo, em conversas que tinha, éramos avisados de que o BES ia por um mau caminho por força dos investimentos na parte privada.

Os reguladores podem exigir e, quando se trata de informar, falhar?
Acontece, mas não têm esse direito. Um regulador que falhou na sua função deve ir pura e simplesmente para a rua. Tenho ouvido períodos largos da comissão de inquérito ao BES e estou cada vez mais confundido: porque é que o regulador não actuou em tempo e porque é que acabaram com o BES. O que sei é que a morte do BES foi um desastre para este país, é o descrédito da iniciativa privada, das administrações. Assim como é preciso ter confiança nos políticos, é preciso ter confiança nos conselhos de administração. Espero que algum dia, ainda na minha vida, se venha a saber a verdade.

Ouvi-o dizer que bastaria os corruptores fazerem uma espécie de "time out" para resolver uma boa parte dos problemas de Portugal. Como seria?
Há dois tipos de corrupção, aquela que chamo do porteiro, cá em baixo, e não tem valor nenhum, e a grande corrupção. E a grande corrupção sabe-se exactamente onde está.

Onde está?
Tem é de se pôr a justiça a funcionar.

Onde está?
Na promiscuidade entre o poder económico e o poder político. E ninguém actua. Permite-se tudo. Um tipo trabalhar para o Estado e no dia seguinte a sair entrar para uma companhia privada. Não pode ser. O Estado está exageradamente em todo o lado. Estive dois ou três anos para obter uma licença para abrir uma creche na Azambuja. E abrimos por minha ordem, porque há sempre alguém a implicar. Há uma lei que diz que tenho de fazer isto, eu faço. Não cumpro, então sim, caiam-me em cima na hora. Chega-se às câmaras, pára tudo. O supermercado de Sintra esteve quatro anos parado. Ninguém decide. E há uma cidade neste país onde não temos um único supermercado porque os terrenos todos pertenciam a determinado tipo.

Que cidade?
Não digo. Tenho de ter cuidado, já não sou o presidente em exercício. Estamos a sofrer a consequência típica de tudo quanto é feito a prazo, sem saber porquê, nem onde começa, nem por onde vai passar. É preciso aumentar a receita, corta-se a eito e criam-se taxas e taxinhas e taxetas de um dia para o outro. Quando se trata de reduzir despesa, que é dos exercícios mais complexos que há, é o ministro das Finanças que vem dizer onde se corta.

Como é que isto se muda?
Daqui para a frente só funciona se dois partidos, os de maior dimensão, se sentarem antes das eleições e acordarem um plano a dez anos para Portugal. Independentemente de quem vier a ser o primeiro-ministro.

Vê essa vontade política?
Infelizmente vai ficar tudo na mesma.

Em quem vota?
Já votei em diversos tipos nas câmaras municipais, se quer que lhe diga. Quando vou votar, depende do programa.

Em que autarquia vota?
Em Lisboa. À partida não voto em ninguém porque, acredite ou não, não me revejo em nenhum partido político português. Sou um democrata cristão convicto, um movimento com origem na CDU alemã de Konrad Adenauer.

Existe democracia cristã em Portugal?
Não temos democracia cristã, não temos social-democracia, não temos socialismo. A única coisa séria que existe em Portugal é o Partido Comunista ortodoxo português. Mas pelo menos sei quem são. E nalgumas câmaras deste país são até os melhores. Nas últimas eleições decidi não votar e uma neta disse-me: "O avô deixou de ter o direito de reclamar." E eu fui votar.

Qual o seu maior receio nestas eleições?
Ficar tudo na mesma. Acho muito interessante a quantidade de pessoas que dizem que o PS vai ganhar. Não sei quem vai ganhar, tem de correr muita água, da situação internacional à economia nacional. O que me preocupa é não haver maioria e combinarem coligações sem terem sido discutidas, aplicarem programas que o eleitorado não votou. Devíamos votar de acordo com um plano que nos jurassem que é para cumprir.

E se não for cumprido?
Temos uma arma, que é votar em branco. Mas é importante, qualquer que seja a cor política, pensar no futuro. Você tem de pensar nos seus filhos e eu tenho de pensar nos meus netos e de preferência gostaríamos que eles ficassem em Portugal. Mas só haverá investimento em Portugal se mudarmos radicalmente o nosso modo de ser. Somos um país que importa tudo mas não temos marinha mercante, temos uma companhia de aviação a cair de podre e fazem greves... A lei tem de ser mudada. Já viu a quantidade de greves no Metropolitano? Porquê? Quando há um líder sindical que já diz que este vai ser um ano de reivindicação e de rua, em que é que está a pensar? Não é no país, com certeza. Por exemplo, sou francamente favorável a que me digam a composição do governo logo que vou votar e não apenas quem será primeiro-ministro. Quando vou ao futebol quero saber a equipa inteira que joga. Se há uma coligação PSD-CDS, quero saber dos acordos. Isso é que é exercer o meu direito de cidadania e é isso que os partidos políticos recusam.

Por isso pergunto: o que fazer quando os governos não cumprem?
Penso que nesse caso o presidente da República tem por obrigação dirigir-se à nação e perguntar-lhe o que quer fazer. Por ser o único órgão directamente eleito pelo povo, tem obrigação de dar contas ao povo. Por isso os programas devem ser discutidos. Parece demagogia, mas um dos debates que existem no grupo JM é saber que sociedade seremos dentro de dez anos. Senão, como sei se vai continuar a haver supermercados? E nós, vamos voltar para uma Europa federal? Ficamos no euro? Qual é a política em relação a Angola, porque não temos um acordo de reciprocidade, porque é que uma companhia que vai para Angola é obrigada a ser minoritária e quando vem uma angolana para Portugal e pode ficar com tudo?

Falou na TAP. Deve continuar nacional?
A mim não me interessa, eu quero uma companhia que me garanta horários de voo, segurança e ir sentado numa cadeira em bom estado. A TAP, neste momento, em classe executiva, parece uma low cost, mal dá para mexer os joelhos, os horários não são minimamente responsáveis, os dias de voo estão permanentemente a mudar e o pessoal de bordo vai a discutir os problemas sindicais.

A origem do capital é-lhe indiferente?
Tem de haver regras e o centro de decisão deve ser cá. Não estou a ver a privatização de uma TAP para a TAP desaparecer. O que me queixo é de obrigarem a Cimpor a ir para os brasileiros porque a CGD não pode financiar um industrial português. Desmantelámos uma empresa portuguesa internacional.

Disse uma vez que contrataria Sócrates. Mantém?
Disse que se ele se apresentasse no JM o contrataria como trainee e tentaria mudá--lo. Se não mudasse tinha de o pôr na rua.

Porquê?
É uma pessoa com determinação, com força. O problema dele é a mentira. Sócrates raramente diz a verdade. E não podemos ter um primeiro-ministro que mente.

Acredita que mudaria Sócrates?
Não seria fácil e com o currículo dele até hoje tenho grandes dúvidas [risos].

O que o poria a fazer?
Um trainee no JM vai para os armazéns, trabalha na carne, no peixe, para perceber o que é a companhia e os problemas das pessoas. Eventualmente iria apanhá--lo a jogar futebol com uma couve.

Compreende a atitude de prender para investigar?
A justiça está a cumprir a lei. Quantas e quantas pessoas ficam em prisão preventiva e ninguém fala nelas? Isto veio perturbar uma estratégia, um senhor que se preparava para ser candidato à presidência da República e estourou. O juiz interpretou que as razões eram sérias, não tenho de protestar.

E se nada vier a ser provado?
Digo-lhe uma coisa, se isto não dá em nada, aí é que Portugal fica num grande bagaço. Porque aí começa a duvidar da justiça. Para dar um passo destes, a justiça tem de estar muito bem apoiada.

Deste governo, quem contrataria?
Pires de Lima, de caras. Para CEO, membro da administração... Aliás, já tivemos namoro [risos]. É uma pessoa séria e que tenta fazer as coisas bem. Sabe, um Presidente da República e um primeiro-ministro têm de ter uma visão do mundo, uma profunda cultura e uma experiência profissional muito vasta. Se a carreira universitária é pobre, se não tem experiência rigorosamente nenhuma de nada, o primeiro-ministro não pode estar sentado num conselho em Bruxelas.

A política especializou-se...
E é por isso que tem uma crise brutal em todo o mundo, não tem líderes como no passado: Mitterrand, Churchill, Adenauer e outros.

O que era diferente?
Havia mais privacidade. E hoje é de uma intensidade brutal, não sei como um primeiro-ministro se aguenta quatro anos. E sem condições. Os nossos Falcon já deviam estar na reserva, mas não se pode ter um avião novo porque vai haver reacção. Faz sentido? Faz sentido um primeiro-ministro viajar em económica quando há um investidor que vai lá à frente? Ganha-se muito pouco para o muito que se exige e é-se considerado milionário por ter uma reforma de 3 mil euros. Depois é preciso tomar decisões e ninguém as toma.

Os movimentos que estão a acontecer pelo mundo e aqui na Europa, a guerra, preocupam-no?

Muito. A estratégia do JM é só países cristãos. O único país que sempre aceitou bem qualquer raça, qualquer credo, foi Portugal. Vai para o Brasil a mesma coisa, como nos países da América Latina. Há uma excepção a esta regra, que são os EUA. Agora os franceses vêm falar de integração? Uma ova. Os franceses nem dos europeus gostavam, porque quando fui para a Lever nem me falavam a mim e a um belga. E sofremos com a Polónia... Sei lá o que vão fazer os bandidos dos russos.

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