quarta-feira, 20 de agosto de 2014

O laboratório do Porto está a aquecer. PSD defende entendimento com CDS para derrotar Rui Moreira em 2017.

PSD considera que Rui Moreira é o chairman da Câmara do Porto e Manuel Pizarro o CEO (administrador executivo)

EDITORIAL / PÚBLICO / 20-8-2014
O laboratório do Porto está a aquecer
Rui Moreira gere a mais complexa aliança da história do Porto. O fim da história é maior do que a cidade

Eleito há um ano com 40% dos votos, o novo presidente da Câmara do Porto, Rui Moreira, gere aquilo que, visto como um desenho, parece um puzzle impossível de montar ou um quadro de M.C. Escher, o artista holandês famoso pelas suas construções impossíveis. Na Câmara do Porto, como nos quadros de Escher, as possibilidades são infinitas. Nenhuma grande cidade portuguesa é gerida por um “governo” tão complexo. De entre os seus vereadores com pelouros executivos, Moreira tem colegas que são ex-PSD, que são actuais PS e actuais CDS e independentes. Como ele. Nesta aliança nunca vista, uma espécie de híbrido excêntrico, até a sua vice-presidente trabalhou directamente com Rui Rio, o anterior presidente, um social-democrata cujo futuro é uma incógnita. O que está a acontecer no Porto é um laboratório vivo. Nunca foi experimentado em Portugal a esta escala. Não é apenas novo o facto de a segunda maior cidade ter sido ganha por um homem que não vem de nenhum partido. É inovador o sistema de alianças que forjou. Moreira foi eleito com o apoio formal do CDS, mas poucas semanas depois de ganhar incluiu o PS na gestão da autarquia e fez um acordo de governação.
Derrotado como nunca no Porto, o PSD tenta agora renascer das cinzas deixadas pelos 21% de votos de Menezes. Vai tentar dividir o que está à partida dividido. Vai tentar puxar para si o CDS, que é seu parceiro nacional. Não tem um nome forte para derrotar Moreira, cuja frescura ainda perdura. Mas sabe que a frescura não é eterna. Por onde vai Moreira sair nesta complexa escadaria de Escher? Se o seu governo der certo, se melhorar a vida da cidade e encontrar respostas para os problemas, a sua estranha amálgama ideológica incentivará independentes e fragilizará as velhas máquinas partidárias. Se falhar, perdemos todos. Não apenas o Porto.

PSD defende entendimento com CDS para derrotar Rui Moreira em 2017
Democratas-cristãos, que apoiaram actual presidente da Câmara do Porto, não fecham a porta a um entendimento com o parceiro da coligação, mas dizem que ainda é cedo para discutir as autárquicas

O PSD considera que Rui Moreira está a cometer um “erro político” ao dar poder a Manuel Pizarro
Margarida Gomes / 20-8-2014 / PÚBLICO

Onze meses após a eleição do independente Rui Moreira, o PSD começa a pensar numa candidatura alternativa ao actual presidente da Câmara do Porto. As próximas eleições autárquicas só vão realizar-se em 2017, mas o PSD entende que esta é a altura para começar a preparar o próximo combate e bater-se-á para encontrar um candidato forte que protagonize uma candidatura que envolva também o CDS.
“Gostaria que houvesse condições políticas no futuro para que o PSD e o CDS se entendessem e tivessem um relacionamento político normal como sempre tiveram na cidade do Porto”, declarou ao PÚBLICO o presidente da comissão política concelhia do PSD, Miguel Seabra. “Estamos juntos no Governo, estivemos juntos nas recentes eleições para o Parlamento Europeu e faria sentido que, no futuro, CDS e PSD se entendessem relativamente às eleições autárquicas”, defendeu Miguel Seabra.
O CDS não fecha a porta a uma eventual coligação com o parceiro do Governo para a Câmara do Porto, todavia, considera que é um pouco cedo para o partido se concentrar já na questão das autárquicas. Até porque o CDS foi o único partido que apoiou a candidatura de Rui Moreira ao Porto. No entanto, fonte do CDSPorto declarou que o parceiro natural dos democratas-cristãos é o PSD. “Com muito mais facilidade fazemos um entendimento com o PSD préeleitoral para governar a Câmara do Porto do que com o PS”, disse a mesma fonte, convicto de que Moreira será de novo candidato em 2017.
Eleito sem maioria absoluta, Rui Moreira optou por fazer um acordo com o PS com duração de quatro anos que “visa garantir a governabilidade estável, eficiente e competente na cidade do Porto e, mais especificamente, na Câmara Municipal do Porto, na assembleia municipal e nas juntas de freguesia”. Mas, no executivo, houve quem reprovasse a opção do presidente e pouco depois começavam as primeiras desavenças.
O primeiro ano de mandato de Rui Moreira tem nota negativa para o PSD, que considera que o “presidente está a cometer um erro político” ao entregar a gestão da autarquia ao primeiro vereador socialista no executivo, Manuel Pizarro.
Fonte socialista rejeita as acusações e afirma: “O PS, para cada problema, tenta encontrar uma solução; o mesmo não acontece com alguns vereadores, que arranjam problemas e não soluções”.
“Notoriamente, Manuel Pizarro está muito mais por dentro das coisas e tem um pelouro [Habitação e Acção Social] com muita visibilidade e, nessa perspectiva, podemos dizer que temos um chairman [Rui Moreira], na lógica de uma empresa, e um CEO, que é o administrador executivo, que é Manuel Pizarro”, afirma o vereador independente eleito na lista do PSD, Ricardo Valente.
Existe o receio que o clima de crispação que se instalou entre o presidente e Guilhermina Rego e Sampaio Pimentel, os dois vereadores que integraram o anterior executivo de Rui Rio e que o apoiaram na corrida à Câmara do Porto, se venha a acentuar.
Sampaio Pimentel, número dois no executivo, é acusado de ter posições “muito radicais” e esta postura tem-lhe valido algumas desautorizações, mas o vereador do CDS não pretenderá desviar-se um milímetro que seja das suas convicções políticas. O episódio mais recente tem a ver com as salas de consumo assistidas, um tema que a autarquia está a estudar, mas que merece a total reprovação do autarca do CDS.
Há pouco mais de uma semana, estalou uma nova polémica relacionada com a nomeação do coreógrafo Tiago Guedes para director de programação do Teatro Municipal, que inclui o Rivoli e o Teatro do Campo Alegre. Neste caso, a despesa foi feita pelo presidente da distrital do CDSPorto, Álvaro Castello-Branco.
As declarações do ex-vice-presidente de Rui Rio e actual administrador da Águas de Portugal desagradaram profundamente a Rui Moreira, que acabaria por desmarcar uma reunião que tinha agendada com Castello-Branco para o dia seguinte.
Em declarações à Lusa, CastelloBranco acusou o recém-nomeado director de programação de “arrogância” pelas “considerações políticas” que fez enquanto trabalhador “avençado da Câmara Municipal do Porto”. Em causa está a entrevista de Tiago Guedes ao PÚBLICO na qual afirmou que o Teatro Rivoli “não tem sido bem cuidado” e foi deixado “em muito mau estado pelo Filipe La Féria”. Na altura, criticou a “inexistência de uma política cultural” na cidade nos últimos anos.
Em cima da mesa está agora a privatização da Sociedade de Transportes Colectivos do Porto, um assunto que também não é pacífico a nível do executivo. Há vereadores que consideram que a câmara decidiu concorrer porque, uma vez mais, Pizarro convenceu o presidente. Para alguns, “a privatização da STCP representa um embaraço gigantesco para o Governo, mas sobretudo para o CDS”, porque o assunto está sob a tutela do ministro Pires de Lima.

O PÚBLICO tentou contactar Rui Moreira, sem sucesso.

Sem comentários: