segunda-feira, 26 de maio de 2014

Fascistas e anti-semitas: os eleitos mais à direita que Le Pen. Diversidade e potência dos populismos.

Gabor Vona, líder do Jobbik húngaro

Fascistas e anti-semitas: os eleitos mais à direita que Le Pen
CLARA BARATA 26/05/2014 - PÚBLICO
Para além de eurocépticos, foram eleitos eurodeputaos claramente racistas.

Este Parlamento Europeu vai ser tomado de assalto por uma multidão de deputados eurocépticos, mas entre eles há um subgrupo de eleitos cujas ideias podem ser descritas como fascistas e racistas e, sobretudo entre os que são provenientes da Europa de Leste, anti-semitas. É o caso do Jobbik húngaro, um partido de extrema-direita que tanto no discurso como em acções é anti-judeus e anti-ciganos.

Com 14,7%, o Jobbik elegeu 12 eurodeputados, apesar de pouco tempo antes das eleições de 25 de Maio, um deputado desta formação ter sido acusado de espiar no Parlamento Europeu a favor da Rússia.

Mas a grande surpresa veio da Alemanha, em que os neonazis do Partido Democrata Nacional, que concorreram com um programa anti-imigração, mas são classificados como racistas e anti-semitas, elegeram pela primeira vez um eurodeputado. Os seus líderes dizem coisas como “a Europa é um continente branco” e têm cartazes com frases como “dá-lhe gás”. O partido eurocéptico Alternativa para a Alemanha obteve também sete deputados para o Parlamento Europeu.

Na Grécia, o Aurora Dourada, partido de clara inspiração nazi, elegeu três eurodeputados, apesar de o seu líder, Nikos Michaloliakos, e vários deputados, estarem presos.

Estes partidos não estão aliados com a Frente Nacional ou o Partido da Liberdade de Geert Wilders e não se sabe se conseguirão formar um grupo parlamentar à parte.


No entanto, a onda eurocéptica acabou por retirar votos a algumas das forças mais extremistas e violentas de extrema-direita que perderam os seus eurodeputados, segundo uma tabela feita pelo centro de investigação britânico Counterpoint, como o Attaka búlgaro, o Partido Nacional Britânico ou até mesmo o Partido Nacional Eslovaco.




COMENTÁRIO
Diversidade e potência dos populismos
JORGE ALMEIDA FERNANDES 26/05/2014 - PÚBLICO
Estas eleições foram as primeiras em que a temática europeia esteve em grande plano — exactamente graças aos eurocépticos.

As eleições europeias foram dominadas pelo "terramoto" francês. A vitória de Marine Le Pen não foi surpresa: estava anunciada há meses.

Inimaginável é a humilhação do Partido Socialista que não sabe onde foram parar os eleitores da esquerda. Salva-se o Partido Democrático, de Matteo Renzi, que obteve uma clara vitória embora as projecções divirjam quanto à sua dimensão. Na Grã-Bretanha, o UKIP aumenta a pressão sobre Cameron para acelerar o referendo sobre a União Europeia. A vitória dos populistas na Dinamarca terá efeitos menores: mostra, no entanto, que o "populismo dos ricos" continua bem vivo.

Estas eleições foram largamente marcadas pelas agendas políticas nacionais mas foram também as primeiras em que a temática europeia esteve em grande plano — exactamente graças aos eurocépticos.

Populismos e Europa

O voto populista não é um fenómeno novo. Aquilo que se designa por populismo é uma nebulosa de correntes e ideologias diferentes e, por vezes, apenas um estilo próprio de fazer política. Há nacionalistas de extrema-direita que querem restabelecer a soberania do Estado-nação (caso francês), há "eurófobos" liberais que querem simplesmente romper com a UE (caso britânico), há populistas "hiperdemocráticos" que visam abater o sistema e a "casta política (caso italiano) ou populismos neo-fascistas (casos da Grécia ou da Hungria).

O populismo não é apenas alimentado pela crise económica e pelo desemprego mas também pelo "medo dos ricos" que defendem ciosamente o seu modelo contra tudo que é "estrangeiro"— poder-se-ia falar até num "protecionismo do Estado Providência" reservado aos nacionais. Em países que não pertencem à UE, como a Noruega ou a Suíça, mostram grande capacidade de mobilização. Não é necessariamente a UE que os cria: a sua grande mola foi e é a globalização.

O que parece novo é a sua capacidade de federar os descontentamentos e frustrações sociais e políticas. Articulam um contra-programa político em torno de temas como a imigração, a islamofobia, o proteccionismo, a denúncia das elites e da política tradicional. À primeira vista, formam um conglomerado disperso e contraditório. Esta ideia é ao mesmo tempo verdadeira e ilusória: os populistas dispõem hoje de um cimento que potencia a sua capacidade de dano. É o anti-europeísmo, a denúncia do "monstro de Bruxelas" e o combate contra o euro. "Transformar as próximas eleições europeias num triunfo eleitoral contra Bruxelas", proclamava o eurocéptico holandês Geert Wilders.

Alguns efeitos

Deste ponto de vista, a leitura dos resultados é ambivalente. A generalização dos populismos corre o risco de levar os governos a aceitarem os seus argumentos e a reduzir o seu compromisso europeu. Pode também, inversamente, suscitar uma mobilização pró-europeia. O "choque Le Pen", pela sua potência, poderá ter efeitos imprevistos.

A crise europeia não é apenas económica mas também política e de legitimidade, escreve o espanhol José Ignacio Torreblanca. "Abriu uma brecha no interior da UE, entre elites e cidadãos, entre credores e devedores." Está a provocar a erosão da democracia representativa. Generaliza-se a noção da mediocridade e falta de horizonte da política.

Um outro efeito a nível nacional é a decomposição de alguns sistemas bipartidários. A bipolarização que dominou a V República francesa está a desmoronar-se. Na Itália, Grillo continua tentar travar a recomposição do bipartidarismo, já que Berlusconi está em queda livre. Na Espanha, é também patente o seu desgaste. Também o UKIP pode alterar o quadro partidário britânico.


Os europeístas estão hoje numa posição defensiva, exactamente ao contrário da euforia dos anos 1980-90. A iniciativa pertence aos populistas. "Eles dão o tom à política na Europa", resume o francês Dominique Reynié. "Os populistas aparecem como a única política forte. Propõem um discurso fundado num recuo identitário e na busca duma soberania a reencontrar num mundo cada vez menos ocidental. Perante este discurso simplista, os governos limitam-se a propor uma redistribuição dos recursos." Disse alguém que os partidos de extrema-direita, que não têm os contrangimentos de governar, "são os últimos a vender sonhos".

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