quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

Entrevista com António Capucho/ Margarida Gomes / 14 fev 2014 / Público.


“Tenho perfil para o lugar de Presidente da República”
Fala da caça às bruxas e mostra-se desiludido com Pedro Passos Coelho, acusando-o de ter transformado o PSD num partido com “vocação muito liberalizante e radicalmente conservador”

Acho inacreditável que na moção [de Passos] se defina o perfil presidencial pela negativa. Aquilo que o Presidente não deve ser”
Entrevista Margarida Gomes / 14 fev 2014 / Público

Recém-expulso do PSD por ter liderado uma candidatura adversária à do partido na Assembleia Municipal de Sintra, o conselheiro de Estado fala das presidenciais de 2016 e diz que tem experiência, bom senso e currículo para concorrer a Belém. Manuela Ferreira Leite e Leonor Beleza são duas personalidades com perfil para a Presidência da República. Como é que um fundador do PSD se sente ao ser expulso do partido no qual militou 40 anos? Tenho alguma nostalgia desses tempos e pena de que as circunstâncias tenham encaminhado a direcção do partido para esta decisão iníqua e precipitada, mas também devo confessar que desde há dois anos tenho a militância no partido suspensa por discordâncias profundas com as orientações a nível do PSD e a nível do Governo, pelo que não há uma alteração substancial em relação à minha situação.
Há quem fale de caça às bruxas...
A direcção política nacional e a direcção política distrital não suportam ver nos cargos de responsabilidade do partido pessoas que não sejam seguidistas. Sendo Sintra o terceiro maior município do país, o PSD não gostou que um militante como Marco Almeida se tivesse candidato à câmara e não hesitou em aplicar, de uma forma que considero despropositada, sanções aos militantes que assumiram essa atitude. Só em Sintra, foram 90 militantes que se candidataram ao lado de Marco Almeida.
Está desiludido com Passos Coelho?
Estou desiludido desde uma primeira decisão que tomou e que me pareceu um disparate colossal, que foi o de avançar com o dr. Fernando Nobre, completamente impreparado e desajustado, para o cargo de presidente da Assembleia da República. Quando exprimi publicamente essa posição, enfim, começaram a suceder situações que considero muito negativas para o país e para o partido e entrámos em rota de colisão. Que avaliação faz dos dois anos e meio do Governo PSD/CDS? Faço um balanço negativo, sendo certo que há algumas áreas onde tenho de reconhecer que a actuação é globalmente positiva, como a saúde. A grande questão tem que ver com o facto de o partido ter subscrito com o PS e o CDS o protocolo de acordo com a troika. Não nos devíamos ter revisto nos termos do acordo e, mais do que isso, não deveríamos ter feito o que o PSD fez que foi elogiar o acordo e ser mais troikista que a troika. Adoptou uma estratégia extremamente negativa que assassinou muito o tecido empresarial, a economia do país, e provocou o crescimento do desemprego de uma forma brutal. Disse que o PSD se afastou da sua matriz social-democrata. Ideologicamente, o que é o PSD de hoje? O PSD é exactamente aquilo que o dr. Pedro Passos Coelho anunciou na candidatura em livro que apresentou os princípios programáticos que pretendia e que tinham pouco de social-democrata e muito de neoliberal. Na prática política veio-se a confirmar que essa matriz social-democrata que está na génese do partido foi perdendo em benefício da estratégia adoptada a nível do Governo e do partido. Está a dizer que o PSD é hoje um partido neoliberal? Temos um PSD com uma vocação muito liberalizante e radicalmente conservador. O PSD ultrapassou pela direita radicalmente o próprio CDS-PP, que, apesar de tudo, ainda tem alguns valores democratascristãos que são respeitáveis Enquanto militante chegou a defender a regeneração do PSD. De que forma? Com estes dirigentes e no estado em que está o partido, muito fechado em si próprio, sendo constituído por um conjunto de oligarquias a todos os níveis, é muito difícil regenerá-lo por dentro, mas não é impossível e, se essa circunstância acontecer, se o partido tiver um líder com capacidade, carisma, honestidade e competência. Aí admito a hipótese de regressar.
Passos Coelho definiu o perfil que considera adequado do
próximo candidato a Belém. Concorda com esse perfil? Não. Acho que o perfil devia de ser exactamente o contrário. Acho inacreditável que numa moção de estratégia [que Passos Coelho vai apresentar no Congresso do PSD na próxima semana] se defina o perfil presidencial pela negativa — aquilo que o Presidente não deve ser. O que defendo é que o próximo Presidente da República possa ter uma leitura mais intervencionista ao nível da sociedade. Passos Coelho teve por objectivo queimar Marcelo Rebelo de Sousa, provavelmente porque não lhe convém ter uma pessoa com o seu perfil, mas é um tiro que lhe sai pela culatra.
Marcelo seria um bom Presidente da República?
Tem capacidade política, inteligência e sentido de Estado que satisfazem perfeitamente os requisitos para a Presidência da República. Não quer dizer que venha a apoiar o Marcelo Rebelo de Sousa, porque outros candidatos poderão aparecer com qualidades iguais e que possam merecer a adesão do eleitorado que possa estar sintonizado com esta perspectiva da Presidência da República.
Alguma vez pensou em candidatar-se à Presidência da República?
Não afasto liminarmente essa hipótese. Não é uma coisa em que pense todos os dias, nem todas as semanas, nem todos os meses, apenas digo, por uma questão de princípio, que não a afasto liminarmente. Sinto-me com perfil para o lugar, mas não é nada que ambicione desesperadamente, nem sequer tenho a expectativa de poder vir a reunir condições para isso. O grande problema tem que ver com a falta de apoios? Uma candidatura à Presidência da República exige investimento, exige uma despesa avultada, em matéria de apoios. Não estou ligado nem nunca estive a nenhum sector empresarial, nunca exerci qualquer cargo em empresas públicas ou privadas, nem consultadoria a partir do momento em que abracei o PSD, em 1974, e não creio que seja um candidato susceptível de concitar apoios a esse nível.
E currículo?
Tenho experiência política, bom senso e um currículo diversificadíssimo que me deu uma experiência que não terá paralelo noutros militantes do PSD. Há muitos homens e mulheres dentro do PSD que reúnem condições excelentes para o efeito, designadamente senhoras. Era interessante ver, finalmente, uma mulher em Belém
Por exemplo?

Quer Manuela Ferreira Leite quer Leonor Beleza têm claramente perfil para isso.

Sem comentários: