terça-feira, 30 de julho de 2013

"Há aqui também uma questão ideológica óbvia e que eu não escondo."

"Tenho vontade de ir ao Parlamento para acabar rapidamente com esta palhaçada" afirmava Viegas em 24 de Julho ao Jornal i.

"Há aqui também uma questão ideológica óbvia e que eu não escondo."



Francisco José Viegas

"Há aqui também uma questão ideológica óbvia e que eu não escondo", disse Viegas. Referia-se à posição defendida por muitos membros tanto do PSD como do CDS que consideram que as leis e políticas de protecção do património não podem sobrepor-se ao direito à propriedade privada previsto na Constituição da República Portuguesa (CRP).
Viegas omitiu da sua exposição o ponto 2 do mesmo artigo, onde se esclarece que se consideram ainda bens do património nacional "aqueles que, não sendo de origem ou de autoria portuguesa, se encontrem em território nacional e se conformem com o disposto no n.º 1 do artigo 14.º" - ou seja, todos aqueles "que representem testemunho material com valor de civilização ou de cultura".
"Cinco anos de cadeia ou 600 dias de multa", esclareceu a deputada, que viu ficar sem resposta várias das suas perguntas, entre elas aquela em que tentou saber por que não foi a decisão de Viegas publicada em Diário da República, como o previsto por lei.

 Audição de Viegas sobre caso Crivelli transforma-se numa batalha jurídica


Oposição acusa ex-secretário de Estado de deixar a ideologia sobrepor-se à lei e Partido Comunista fala mesmo num "acto à margem da lei".
“Tomei a minha decisão dentro da legalidade”, disse esta terça-feira na Assembleia da República o ex-secretário de Estado da Cultura Francisco José Viegas, que pediu ao Governo para ser ouvido na Comissão de Educação, Ciência e Cultura sobre o polémico “caso Crivelli”, relativo à autorização de saída de Portugal e venda no estrangeiro da pintura protegida Virgem com o Menino e Santos, do conhecido empresário Miguel Pais do Amaral.
Na comissão, que se tornou rapidamente numa batalha jurídica, Viegas citou uma sequência de artigos da Lei 107/2001, conhecida como Lei de Bases do Património, que entendeu justificarem a decisão que tomou em 2012. Contudo, a partir da mesma lei, apenas citando artigos diferentes, a oposição em peso apontou os motivos porque entende que essa decisão não tem qualquer enquadramento legal – os mesmos motivos por que está agora em revogação pelo sucessor de Viegas no também Governo de Passo Coelho.
Entre outros, Viegas citou o ponto 1 do artigo 55º que diz que só são considerados bens móveis integrantes do património cultural português aqueles que “constituam obra de autor português ou sejam atribuídos a autor português, hajam sido criados ou produzidos em território nacional, provenham do desmembramento de bens imóveis aí situados, tenham sido encomendados ou distribuídos por entidades nacionais ou hajam sido propriedade sua, representem ou testemunhem vivências ou factos nacionais relevantes a que tenham sido agregados elementos naturais da realidade cultural portuguesa, se encontrem em território português há mais de 50 anos ou que, por motivo diferente dos referidos, apresentem especial interesse para o estudo e compreensão da civilização e cultura portuguesas”. Viegas não citou, contudo, o ponto 2 do mesmo artigo, onde se esclarece que se consideram ainda bens do património nacional “aqueles que, não sendo de origem ou de autoria portuguesa, se encontrem em território nacional e se conformem com o disposto no n.º1 do artigo 14.º”. Este último artigo diz que são todos aqueles “que representem testemunho material com valor de civilização ou de cultura”. É este o caso da pintura de Pais do Amaral, segundo vários especialistas em pintura e património a que o gabinete do próprio Viegas pediu pareceres em 2011 e cujos pedidos de permanência da obra em Portugal acabaram por ser ignorados.
Em resposta a questões de Miguel Tiago, do Partido Comunista, Viegas acabou por afirmar o seu posicionamento ideológico: “Há aqui também uma questão ideológica óbvia e que eu não escondo”, disse, referindo-se ao entendimento de muitos membros do PSD e CDS sobre a forma como a protecção do património não deve sobrepor-se ao direito à propriedade privada. Segundo a oposição, contudo, o que esteve em causa na decisão de Viegas foi “um acto à margem da lei”: “A lei diz que podia ter impedido a saída. A sua perspectiva ideológica corresponde a um posicionamento legítimo. Já governar contra o que a lei estabelece é abusivo”, disse Miguel Tiago.

Viegas defende a "questão ideológica" por detrás do polémico "caso Crivelli"


Oposição acusa ex-secretário de Estado da Cultura de um "acto à margem da lei" na autorização de saída de Portugal e venda no estrangeiro da importante pintura renascentista Virgem com o Menino e Santos
Argumentos legais num corpo-a-corpo contra argumentos políticos: durante a batalha em que ontem se transformou a Comissão Parlamentar de Educação, Ciência e Cultura, o ex-secretário de Estado da Cultura (SEC) Francisco José Viegas reconheceu a existência de fundamentos ideológicos na autorização que em 2012 deu ao conhecido empresário Miguel Pais do Amaral para vender no estrangeiro a pintura protegida Virgem com o Menino e Santos, acabando por ter sido acusado pela oposição de um "acto à margem da lei".
"Há aqui também uma questão ideológica óbvia e que eu não escondo", disse Viegas. Referia-se à posição defendida por muitos membrostanto do PSD como do CDS que consideram que as leis e políticas de protecção do património não podem sobrepor-se ao direito à propriedade privada previsto na Constituição da República Portuguesa (CRP).
Juridicamente, segundo a procuradora-geral adjunta do Tribunal Central Administrativo Raquel Vicente da Rosa, essa posição não tem enquadramento. "Resulta do art. 62.º da CRP não ser o direito de propriedade um direito absoluto [...], pelo que a possibilidade legal de o Estado se opor à exportação de uma obra [...] constitui, não uma arbitrariedade, mas um simples condicionamento", escreveu a jurista num parecer ligado ao caso e datado de 6 de Setembro de 2011, dia em que terá chegado ao gabinete de Viegas, onde acabou por ser ignorado (ver PÚBLICO de 22/7/2013). Deste facto, ontem, a oposição fez a leitura política: "A lei diz que podia ter impedido a saída [da pintura do país]. Governar contra o que a lei estabelece é abusivo", disse o deputado do PC Miguel Tiago, acrescentando que o "acto à margem da lei" de Viegas "só não é crime porque não foi o ex-secretário de Estado que levou a peça para fora do país". Inês de Medeiros, do PS, pôs, mesmo assim, na mesa a punição prevista para a exportação ilícita de uma obra de arte: "Cinco anos de cadeia ou 600 dias de multa", esclareceu a deputada, que viu ficar sem resposta várias das suas perguntas, entre elas aquela em que tentou saber por que não foi a decisão de Viegas publicada em Diário da República, como o previsto por lei.
Paradeiro desconhecido
Também sem várias resposta ficou a coordenadora do BE Catarina Martins, que menorizou a importância da presença de Viegas na Assembleia quando o que importa, na sua opinião, é ver esclarecidas questões como o paradeiro da "Virgem portuguesa" de Crivelli, publicamente desconhecido depois de uma passagem por Paris, onde o antiquário Jean-François Heim chegou a tê-la na montra da sua galeria. Foi antes de o sucessor de Viegas no Governo ter anunciado, no dia 2 deste mês, a revogação da autorização de venda da peça. Depois disso, o antiquário disse ao PÚBLICO que a peça já esteve com ele, "mas já não está". Sobre isso, à Lusa, Pais do Amaral não prestou esclarecimentos e a SEC não tem avançado também detalhes sobre as diligências em curso para resolver a questão.
"O que está a ser feito pela restituição do quadro e onde é que ele está? A polícia já foi buscar a obra?", questionou Catarina Martins. Já fora do Governo, Viegas não poderia responder. Mas a deputada quis informações também sobre os fundamentos legais da sua decisão.
"Tomei a minha decisão dentro da legalidade", disse Viegas, citando uma sequência de artigos da Lei 107/2001, conhecida como Lei de Bases do Património. Entre outros, citou o ponto 1 do artigo 55.º, que diz que só são considerados bens móveis integrantes do património cultural português aqueles que "constituam obra de autor português ou sejam atribuídos a autor português, hajam sido criados ou produzidos em território nacional, provenham do desmembramento de bens imóveis aí situados, tenham sido encomendados ou distribuídos por entidades nacionais ou hajam sido propriedade sua, representem ou testemunhem vivências ou factos nacionais relevantes a que tenham sido agregados elementos naturais da realidade cultural portuguesa, se encontrem em território português há mais de 50 anos ou que, por motivo diferente dos referidos, apresentem especial interesse para o estudo e compreensão da civilização e cultura portuguesas".
Tal como foi pouco depois apontado por Inês de Medeiros, Viegas omitiu da sua exposição o ponto 2 do mesmo artigo, onde se esclarece que se consideram ainda bens do património nacional "aqueles que, não sendo de origem ou de autoria portuguesa, se encontrem em território nacional e se conformem com o disposto no n.º 1 do artigo 14.º" - ou seja, todos aqueles "que representem testemunho material com valor de civilização ou de cultura".
É este o caso do Crivelli de Pais do Amaral, segundo o parecer consensual de especialistas em pintura e património que em 2011 pediram a Viegas que mantivesse a obra em Portugal.
Desde a revelação do caso pelo PÚBLICO (ver edição de 4/6/2013), vários outros especialistas têm defendido publicamente a mesma opinião, incluindo a historiadora e ex-directora do Instituto Português de Museus Raquel Henriques da Silva, que fez saber que várias vezes, ao longo dos anos, o Estado tentou, sem sucesso, comprar esta obra, precisamente devido ao facto de se tratar de uma peça "única".

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