quinta-feira, 23 de maio de 2013

Antigos administradores da empresa que gere bairros sociais de Lisboa começaram ontem a responder em tribunal.

Francisco Ribeiro, Ex-Administrador GEBALIS
Além das travessas de marisco, a factura do restaurante junto à praia menciona um prato de cherne. "Deve ter sido pedido por mim, que ando sempre de dieta"

Antigos administradores da empresa que gere bairros sociais de Lisboa começaram ontem a responder em tribunal.

O caso dos almoços e jantares em restaurantes de luxo com que três antigos administradores dos bairros sociais de Lisboa se banquetearam ao longo do ano e meio que estiveram em funções começou ontem a ser julgado.
O Grande Livro do Bebé foi uma das aquisições controversas


Os três respondem pelos crimes de peculato e administração danosa. Quando entraram na Gebalis, em 2006, o passivo da empresa detida pela Câmara de Lisboa ia nos 20 milhões de euros - o que não impediu os administradores de frequentarem, a expensas da empresa, o Gambrinus, o Porto de Santa Maria, no Guincho, e outros locais de "requinte gastronómico", como lhes chama o Ministério Público no despacho de acusação. Além de terem tido lugar bem longe da empresa, sediada nos Olivais, e dos bairros sociais que ela geria, vários desses repastos decorreram ao fim-de-semana e em período de férias. Alguns incluíram refeições para crianças. Aos juízes, o então presidente do conselho de administração, Francisco Ribeiro, explicou ontem que fazia tudo parte de uma "estratégia para captar investimento para os bairros": era preciso reunirmo-nos com gente da banca. E os bons negócios em Portugal é sabido que se fazem à mesa. No restaurante Búzio, na Praia das Maçãs, Francisco Ribeiro gastou, de uma só assentada, 338 euros, pagos com o cartão de crédito da Gebalis. "Eu estava lá de férias e para não ter de ir a Lisboa foram lá ter cinco ou seis colaboradores da empresa, para trabalharem comigo", recordou. Nesta altura, as rendas mais altas dos bairros sociais não ultrapassavam os 150 euros.
Além das travessas de marisco, a factura do restaurante junto à praia menciona um prato de cherne. "Deve ter sido pedido por mim, que ando sempre de dieta", observou Francisco Ribeiro, a quem o Ministério Público imputa, no ano e meio que esteve à frente da Gebalis, gastos mensais indevidos em refeições na ordem dos 630 euros. "Acha natural ter gasto mais de 40 euros por cabeça nesse jantar?", questionou um dos juízes, Rui Coelho.
Seja como for, Francisco Ribeiro até foi modesto nos seus gastos, se comparado com os outros dois colegas. Quem o frisou ontem foi o advogado João Nabais, representante da Câmara de Lisboa neste processo em que a autarquia reclama aos arguidos a devolução de 200 mil euros: as refeições de Mário Peças, outro antigo administrador da Gebalis, ficaram ao erário municipal em dois mil euros mensais. O salário dos arguidos incluía uma parcela para despesas de representação, mas Francisco Ribeiro garante que nunca pensou em usar essa verba para pagar os almoços e jantares de trabalho: via-a como parte integrante do ordenado.
Os juízes mostraram ainda alguma perplexidade por terem sido comprados, uma vez mais à custa do erário municipal, objectos tão distantes da temática dos bairros sociais como um aparelho de MP3 ou O Grande Livro do Bebé, que esclarece os pais sobre os primeiros tempos de vida das crianças. A Gebalis ia criar creches, justificou Francisco Ribeiro sobre o livro. Questionado sobre o seu conteúdo, respondeu: "Não sei, nunca o li." Já o MP3 "era para ouvir música na sala do conselho de administração".
Quando a Judiciária foi à empresa, não encontrou nem o Grande Livro do Bebé nem outros produtos pagos pelos cartões de crédito da Gebalis. Na altura não havia critérios para o uso deste meio de pagamento pelos administradores, explicou o arguido. Foi pouco antes de saírem da empresa que Francisco Ribeiro e os seus outros dois colegas criaram um regulamento para o seu uso.



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